terça-feira, 18 de janeiro de 2011

INSACIEDADE

Oscar Wilde (1854/1900)



’Venha mesmo assim.’, disse-me o barão, cuja excitação mundana começava a cair, mas que sentia essa necessidade de prolongar, de fazer durar as conversas que eu já havia notado em casa da duquesa de Guermantes, tanto como em sua casa, e que, sendo particular a esta família, se estende mais genericamente a todos os que, não oferecendo à sua inteligência outra realização além da conversação, quer dizer, uma realização imperfeita, permanecem insaciados, mesmo depois de horas passadas em conjunto e se suspendem cada vez mais avidamente do interlocutor esgotado, do qual reclamam, por erro, uma saciedade que os prazeres sociais não podem dar.”


“La prisonnière”  (Marcel Proust)



Sabe-se que Proust, quando, enfim, “meteu mãos à obra”, considerava um desperdício o tempo roubado à escrita, incluído o da própria amizade.

Temos de valorizar toda a sua vida mundana anterior, como uma espécie de “acumulação primitiva” que, a seguir, se desenvolveu num “modo de produção” absolutamente prodigioso.

Mas era Oscar Wilde que dizia, e, parece-me, sem o lamentar, que o melhor do seu talento o tinha esbanjado nos salões e não no seu espirituoso teatro. Acredito que seja genuíno o prazer de exercer a inteligência numa vida mundana, como a que o nosso Marcel levava, com zelo tal que o confundiram com um “snob”. Quando se encerrou, porém, na sua caverna de asmático, para desenrolar a “Recherche” até poder declarar a Céleste, a sua governanta, com o alívio de quem acaba de salvar para sempre a sua alma, que tinha escrito a palavra fim, todo esse prazer lhe pareceu inconsequente. Prazer que, retrospectivamente, fez do falso mundano um agente secreto do nosso prazer, do nosso supremo prazer de desfrutar da sua leitura.


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