Fialho de Almeida (1857/1911)
Fialho de Almeida (Os Gatos – vol.I) acusa D.
Fernando, esposo de D. Maria II, de se ter apropriado, ao longo dos anos, da
riqueza artística nacional, rapinada dos conventos ou de proprietários
ignorantes e soezes. Umas vezes, esquecendo-se de devolver o que lhe tinha sido
confiado em depósito, outras agindo como um coleccionador, tão rapace quanto
Junot, a quem não tinham chegado três navios para levar para França o precioso
saque (“ainda lhe pudemos arrancar a Bíblia dos Jerónimos, e não sei que outros
monumentos de arte nacional, mercê de uma recompensa em dinheiro, de muitos
contos”).
Ora, quem seguiu o destino que teve o espólio
deixado pelo real consorte à sua segunda esposa, vinda do “tablado” (fora
cantora de ópera), a começar pelo Palácio da Pena, e observou tais sucessos
pelo telescópio da história, não pode deixar de considerar que o Rei-Artista
fez, apesar de tudo, um trabalho de mérito, ao reunir e conservar tamanha
riqueza, a qual não se destinando directamente ao usufruto do povo que acolheu
o Coburgo-Gotha, acabou por fazer parte do património nacional em poucos anos.
Há indivíduos (como uma enzima num vasto
organismo) que servem melhor a colectividade com a sua paixão, “à la longue”,
do que os representantes legítimos, mas com espírito funcionário.
É mais uma das ironias da
história.
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