"É preciso submeter-se às regras da organização para se tornar um seu membro e continuar a sê-lo. É preciso declarar-se pronto a obedecer a ordens e a aceitar responsabilidades. E no seio duma zona pessoal de indiferença, é preciso igualmente estar pronto a aceitar a mudança permanente destas condições. É bem conhecido que um tal processo não funciona nunca de maneira muito planificada, mas comporta sempre um grau considerável de desvio, de ignorância, até de boicote, e tal não surpreenderá, por isso, ninguém. O que se revela em contrapartida surpreendente é a medida na qual se consegue, apesar disso, normalizar um comportamento muito improvável e o qual não poderia ser alcançado num outro contexto."
"Politique et Compléxité" (NIklas Luhmann)
A invenção individual é o melhor exemplo dum comportamento altamente improvável em que uma especialização sui generis coincide com o interesse pessoal. O criador, normalmente, encontra-se suficientemente motivado não só para se familiarizar com as práticas e os saberes necessários à produção que tem em vista, como para converter o que para a maioria seriam sacrifícios pessoais no seu melhor estímulo, e tudo isto, muitas vezes, com o incentivo psicológico dos outros apenas "em esperança". Se Mathilde de La Môle se aborrecia "en espoir", o inventor parece que se alegra a crédito sobre o seu futuro.
O comum dos mortais, porém, só fará coisas extraordinárias e acima das suas possibilidades individuais, sem motivos pessoais (mas não sendo necessariamente altruístas), nem as energias do instinto, a não ser no contexto duma organização. Uma empresa, por exemplo, consegue esse milagre de tornar normal uma especialização como a de servir cafés numa esplanada ou a de construir parquímetros que "não poderia ser alcançado num outro contexto".
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