segunda-feira, 9 de agosto de 2010

O RELOJOEIRO




"Enquanto que a primeira ciência era vista como uma série de provas para o argumento do desígnio, a de Newton era paradigmática. Não só ele tinha visto conexões onde outros viram o caos, encontrado as fórmulas mais elegantes e de maior alcance, juntado o céu e a terra relacionando os seus movimentos. Dum modo mais preciso ainda, Newton tinha mostrado que dada a descrição das condições e propriedades iniciais de todas as suas partes, uma pessoa podia deduzir o estado do sistema do universo em qualquer momento."


"Evil in modern thought" (Susan Neiman)


Como diz a autora, um mundo tão perfeito não precisava de Deus para nada, quando até ali "as pessoas temiam um Deus incompetente, como o de Afonso (o X, que achava que se fosse Deus teria feito melhor), ou um Deus malévolo, como o de Descartes."

Com um mundo entregue a si mesmo e funcionando como um relógio, é a Providência que desaparece de cena. No entanto, Newton, que era um crente fervoroso, apenas pretendeu engrandecer a figura de Deus. Um Deus que só poderia ter criado um mundo perfeito tal como a razão iluminada o poderia compreender.

Como se percebeu depois, a ficção do relojoeiro permitiu aos humanos descobrir engrenagem atrás de engrenagem e acrescentar desmesuradamente o seu poder sobre a natureza mais próxima.

Até que a crise do humanismo e o impasse ambiental vieram alertar para o paradoxo de se considerar o mundo de que fazemos parte como objecto de domínio.

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