sexta-feira, 20 de agosto de 2010

MUDAR O MUNDO


Prometeu




"'A religião é a teoria geral deste mundo, a sua enciclopédia, a sua lógica sob a forma popular, o seu point d'honneur espiritualista, o seu entusiasmo, a sua sanção moral, o seu complemento solene e a base geral para a consumação e a justificação deste mundo… O sofrimento religioso é ao mesmo tempo a expressão do sofrimento real e o protesto contra o sofrimento real. A religião é o suspiro da criatura oprimida, o coração dum mundo sem coração, tal como é o espírito de condições dele privadas. É o ópio do povo." (Karl Marx, 115 ´The Portable Marx´)'

Isto é dizer muito em louvor do ópio. A religião não surge como engano nem narcótico mas cabeça, coração e espírito. É filosofia aplicada, a expressão viva e popular duma única necessidade humana. Ele (Marx) acreditava que ela fosse a consciência da transcendência que nasce da necessidade real. O sofrimento sem sentido é inaceitável, portanto, a filosofia tanto quanto a religião procuram dar-lhe um sentido."

"Evil in modern thought" (Susan Neiman)


Numa única frase, Marx parece desmentir tudo o que disse atrás sobre a religião como teoria e expressão, coração e espírito.

A tarefa da religião e da filosofia de dar um sentido ao mundo torna-se suspeita, aviltante como a droga, porque acaba por ser uma justificação da ordem existente e do sofrimento que comporta.

O que interessa a partir de agora, em vez de tornar o mundo suportável, através do mito ou da ideologia, é "transformar o mundo" e torná-lo imediatamente legível. Um mundo, enfim, harmonioso e livre do mal.

A utopia começa por expulsar a complexidade e tornar desnecessária a mediação dos intérpretes e dos criadores de sentido.

Mas a "transformação do mundo" é muito mais do que a acção humana que, em todos os tempos, efectivamente, mudou o mundo. É um sonho de inteligência e de poder que pretende, na verdade, mudar o homem.

O verdadeiro castigo de Prometeu não é o rochedo no Cáucaso, mas a loucura.


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