"Vós sabei-lo como nós, tal como o espírito humano é feito, só se examina o que é justo quando a necessidade é igual para ambas as partes; mas se há um forte e um fraco, tudo o que é possível é feito pelo primeiro e aceite pelo segundo."
"Resposta dos habitantes da ilha de Melos aos Atenienses (Tucídides)"
Simone Weil gostava de citar esta passagem do livro de Tucídides sobre a guerra do Peloponeso.
Mas transposta esta lição para o conflito mais insanável da actualidade, vemos que o forte e o fraco não estão realmente sozinhos e não se comportam como os Melianos e os Atenienses. Nem Israel pode utilizar toda a sua força, nem os palestinianos do Hamas são obrigados a aceitar o que o inimigo lhes quer impor. Israel sabe muito bem que não está ao seu alcance uma vitória "definitiva", embora (ver o artigo do director de "O Público", de hoje) uma vitória definitiva fosse talvez menos destrutiva do que o estado de guerra permanente. A força, contra a opinião dos Melianos, não pode ser usada pelo mais forte até ao limite do seu poder. Mesmo a superpotência depende desse sistema mundial de equilíbrios precários que pode inibir completamente o "músculo" e reduzi-lo à impotência. A fórmula meliana é porventura verdadeira para o poder absoluto, mas isso é coisa que não existe nos nossos tempos.
É em situações como esta em que o conflito se alimenta, de momento a momento, do que alguns chamam erros e outros actos de prepotência, mas que parecem inspirados, como na Ilíada, por deuses rivais a que nenhum Zeus vem impor uma decisão, que a razão parece mais carente de condições mínimas, sem as quais é tão importante para uma solução como qualquer parte do esqueleto que herdámos de outras épocas evolutivas.
A mistura explosiva de factores políticos e religiosos concentrada na espécie de bunker humano que é a região impõe aos que ainda acreditam no diálogo o mais impressionante dos desafios.
A crítica e a discussão racional que, com tão bons resultados, nos permitem escapar às consequências dos nossos erros e das nossas tentativas falhadas, quando se trata da ciência (Popper), parecem, num terreno tão minado pela causalidade catastrófica e pelas armadilhas ideológicas, ter sido sobrepujadas pela ferocidade das leis naturais.
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