quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

O GÉNIO MALICIOSO


René Descartes (1596/1650)


"O verdadeiro escolho do regime (totalitário) não reside na necessidade espiritual que experimentam os homens de pensar duma maneira independente, mas na sua impotência física e nervosa em se manterem num estado durável de entusiasmo, senão durante alguns anos de juventude. É em função desta impotência física que o problema da liberdade se coloca, porque sob um tal regime uma pessoa sente-se livre na medida em que é entusiasta."

"Réflexions en vue d'un bilan" (Simone Weil)


Diz Simone que todos os regimes totalitários começam por um momento desses, em que o entusiasmo esconde o problema da liberdade, e que é por isso que um estrangeiro reconhece mais cedo do que os que o suportam o carácter tirânico dum regime.

É claro que o entusiasmo nos põe fora da política e no domínio da "possessão divina" (é isso, de resto, o que a palavra quer dizer). Mas entre esse estado e o dum homem com o juízo assente, solto pelo deus, capaz da distância do estrangeiro de que acima se fala, há mais do que um questão de resistência nervosa. Será o entusiasmo o modo de estar da juventude em relação à política (a religião ou o completo desinteresse)?

Os homens não se convertem facilmente e continuarão a interpretar o mundo conforme os seus preconceitos. O entusiasmo colectivo não é uma conversão, mas um contágio sujeito a uma espécie de regime das marés, a que nem os mais velhos escapam. É preciso procurar na mecânica a lei desse estado de espírito.

Por um tal começo, o pior dos regimes parece ganhar em legitimidade, quando, na verdade, haveria mais razão para lembrar o Malin Génie de Descartes.

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