segunda-feira, 15 de março de 2010

O QUE PENSA NO COLECTIVO




"Na aparência quase tudo se cumpre metodicamente nos nossos dias; a ciência é rainha, o maquinismo invade pouco a pouco o domínio do trabalho, as estatísticas ganham uma importância crescente – e num sexto do globo, o poder central tenta regular o conjunto da vida social segundo planos. Mas, na realidade, o espírito metódico desaparece progressivamente, pelo facto do pensamento encontrar cada vez menos em que se aplicar. As matemáticas constituem por si mesmas um conjunto demasiado vasto e demasiado complexo para poder ser dominado por um espírito; (…) Ora, tudo o que o indivíduo não consegue dominar é à colectividade que é cometido."

"Refléxions sur les causes de la liberté et de l'oppression sociale" (Simone Weil)


Estamos muito longe e sempre estivemos de ser metódicos, para além do sonho de controlo sobre a vida social se ter reduzido à escala global, à sua porção côngrua. Parece que a prudência não nos permite mais do que dizer que o estado presente do universo depende do estado imediatamente anterior, do qual, evidentemente, conhecemos uma parte infinitesimal.

Só haveria método se o divino arquitecto vigiasse continuamente o seu plano, o que nem para Simone era o caso.

Não podemos, é claro, dizer que o colectivo pensa, porquanto só um espírito pode fazê-lo. No entanto, o pensamento está no colectivo, na sua organização, nos seus métodos, nas suas iniciativas. Está duma forma diferente em que se pode dizer que está numa ferramenta, plasmado na sua forma, porque o colectivo é vida.

Simone Weil procurava um método para "insuflar uma inspiração a um povo" (era preciso um novo espírito para o pós-guerra), não porque esse povo pudesse pensar, mas para que os indivíduos encontrassem nele um meio propício ao pensamento.

A complexidade nunca foi realmente dominada pelo espírito, sem que isso prejudicasse a eficácia do pensamento, na sua abstracção e nas suas simplificações.

É por isso que não nos ameaça a perda do método e a compreensão da complexidade não é uma impossibilidade nova.

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