Cairo (Reuters) |
“Recentemente,
testemunhámos como não foi preciso mais do que uma rebelião de estudantes
franceses, relativamente inofensivos, essencialmente não-violentos, para
revelar a vulnerabilidade de todo o sistema político, que rapidamente se
desintegrou diante dos olhos espantados dos jovens rebeldes. Sem o saberem,
puseram-no à prova; tencionavam apenas desafiar o ossificado sistema da
universidade, e vieram abaixo o sistema do poder governamental e, ao mesmo
tempo, o das enormes burocracias partidárias – ‘uma espécie de desintegração de
todas as hierarquias’ (Raymond Aron). Como situação revolucionária foi um caso
de manual que não se desenvolveu numa revolução porque não havia ninguém, muito
menos os estudantes, preparado para agarrar o poder e a responsabilidade que o
acompanha.”
“On violence” (Hannah Arendt)
Isto passou-se no
Maio de 1968 parisiense. Mas não podemos deixar de pensar nos acontecimentos da
praça Tahrir.
A violência dum
regime pode não ter por detrás um poder suficientemente sólido. Ela persiste,
enquanto esse poder não for confrontado. Mas como as revoluções não se “fazem”,
verificar que o poder não é tão invulnerável quanto se esperava, não significa
que se siga uma mudança real. Como no caso do Egipto, bastaram as imagens de
Tunes para desencadear o desejo de confronto. Mas estamos no domínio do
simbólico (à imagem de invulnerabilidade sucedeu-se o sentimento da fraqueza do
poder), não do funcional. Se o exército não se desintegrar, salvará este poder,
com ou sem Mubarak.
Escreve Anna
Applebaum no “Washington Post”: “São
traduzidos anualmente mais livros para grego, uma língua falada por 10 milhões
de pessoas, do que para a língua árabe falada por 220 milhões.” (citado por
Teresa de Sousa no “Público” de hoje)
Este fenómeno, que
uns anos atrás poderia consagrar o anacronismo dos países árabes, não impediu o
“contágio” da ideia democrática (que, de resto, pode ter uma vida demasiado
curta, como foi o caso no Irão). Na era das imagens e da informação
instantâneas, a tecnologia pode criar uma nova internacional, sem ideologia ou
profundidade política, que se espalha
como um vírus informático, disponível para ser captada por mais sofisticadas formas
de poder. A invisibilidade e a disseminação (como foi, num tempo, a da
sociedade por acções) são apenas parte dessa sofisticação.
A “engenharia”
financeira espera o seu equivalente na política.
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