Doris Lessing
"Doris Lessing, que pertenceu ao movimento, escreveu que, pela sua parte, considerava Staline como um louco sanguinário, e que essa era uma opinião que lhe era possível partilhar com este ou aquele amigo comunista. Ela nota, apesar disso, que desde que três pessoas estivessem presentes, exprimir essa ideia lhe era impossível, e que ela mesma não teria suportado que se dissesse mal de Staline. Porquê? Porque isso teria sido atingir aquilo que cimentava o grupo. A preservação deste cimento pode chegar a representar a principal preocupação da comunidade, sendo a prossecução dos interesses comuns suplantada pela procura e a conservação duma identidade comum."
"Le symptôme identitaire" (Olivier Rey)
A única força que pode contrabalançar a desagregação característica duma sociedade de massas é essa busca de identidades grupais e, nas palavras do ensaísta, a palavra identidade viu, nos últimos anos, acrescentado um novo sentido à sua definição que é a dum "conjunto de traços próprios a um grupo" ou dum "sentimento de pertença de um indivíduo a um tal grupo".
"É que libertando o indivíduo, se libertam todos os indivíduos. E os comportamentos combinados de todos estes indivíduos compõe um mundo que pode revelar-se, para o sujeito isolado, tão rígido como o antigo." (ibidem)
Por isso, o "cimento" identitário é tão importante, sobrepondo-se ao próprio valor semântico das ideologias.
É curioso que o testemunho de Doris Lessing refira um número que no Cristianismo não é significativo de um limiar identitário, pois "onde dois estiverem reunidos em meu nome, eu estarei no meio deles" (Mt 18,20). Mas o encontro de dois está ainda demasiado próximo do diálogo consigo mesmo. E na sua cabeça, ninguém conversa a três, a não ser, talvez, o poeta dos heterónimos. Não é isto o sinal de que a verdadeira identidade do cristão é a sua relação com Deus e que os grupos identitários têm ainda um vínculo com a Cidade?
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