segunda-feira, 26 de julho de 2010

O ESPÍRITO DAS SELECÇÕES



"Não há melhor chave do que a ascensão de 'The Reader's Digest' para a dissolução das formas, para o incremento da qualidade de 'segunda-mão' da nossa experiência na América do século vinte. Esta, a revista mais popular nos Estados Unidos, apresentou-se não como um 'original'. Mas como um resumo. A sombra vende mais do que a substância. Encurtar e resumir não é mais um dispositivo para levar o leitor até um original que lhe dará aquilo que ele realmente quer. O próprio resumo é o que ele quer. A sombra tornou-se a substância."

"The Image" (Daniel Boorstin)


Para além do "desaparecimento" do original, quando as cópias atingiram o grau de perfeição que se sabe, num processo já analisado por Benjamin, há evidentemente um entendimento da cultura como algo cuja essência se pode extrair num tempo cada vez mais curto. Talvez isto prepare o "download" directo nos nossos cérebros de tudo o que é preciso saber.

Os inúmeros que acham aborrecidas e inúteis as digressões de que grandes autores não abdicam para introduzir um tema, o intricado matagal da frase proustiana, são os mesmos que se rendem ao poder da imagem e que consideram que uma fotografia descreve muito melhor o vale do Indre do que o fez Balzac ao longo de algumas páginas.

O problema é que nós não pensamos por imagens mas, de facto, discorremos sobre tudo e nada através dum monólogo que está mais perto da fala do príncipe da Dinamarca do que do cinema, mesmo dialéctico, de Eisenstein.

O resumo das obras persegue o instantâneo utópico da imagem. Ler assim é turismo e só serve para dizermos que "também estivemos lá".

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