Esaú e Jacob
"O famoso episódio de Jacob que, de acordo com a mãe Rebeca, se traveste com as roupas do irmão Esaú para pedir a Isaac cego a bênção paterna, ensina que esta era muito mais importante que a herança. Pode parecer-nos absurda a sequência daquele engano. Esaú vai ter com o pai e fica a saber do subterfúgio de Jacob. Então por duas vezes pede-lhe: "Abençoa-me também a mim, pai." (Gn 27,34-38) e Isaac cala-se. Há uma só bênção, ainda que tenha dois filhos, somente a um pertence a solene invocação de augúrio e de protecção contida nos versículos 28 e 29 do capítulo 27 do livro Bereshìt/Génesis."
"Caroço de azeitona" (Erri de Luca)
O episódio é tão estranho que parece ter sido escrito só para mostrar a valor da palavra e do gesto simbólico. Tratando-se de signos que tão facilmente se desfazem ou se repetem, era preciso uma história que, pelo contrário, mostrasse que certas palavras e certos gestos são irreversíveis e não se podem repetir porque a história sagrada tem uma economia onde a palavra é toda a acção, como no teatro.
Mas ocorre-me o célebre "words, words, words" hamletiano que parece dizer o contrário. Mas é um caso da palavra dentro da palavra. O destinatário da frase é Polónio, o ridículo camareiro ( e pai de Ofélia). Ao dizer a Polónio (que não está longe de considerar o príncipe louco) que aquilo que está a ler são apenas palavras, é como se o expulsasse do drama, prefigurando a morte do camareiro, escondido atrás do reposteiro, às mãos de Hamlet.
E Isaac cala-se. Não estamos já na ordem do discurso e dos argumentos, mas em plena narrativa do que já foi escrito antes de acontecer.
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