sábado, 10 de julho de 2010

O ARRUMADOR


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O arrumador de automóveis é uma das mais complexas figuras dos novos tempos. Reveladora duma mudança de mentalidades e duma crise dos valores da tradição religiosa.


Comparado com o mendigo que estende a mão à caridade pública e espera beneficiar do preceito cristão de "quem dá aos pobres empresta a Deus", numa passividade conformada e fatalista, o arrumador parece alguém que se coloca numa posição de quase provocação, de quem pode negociar alguma coisa, mesmo que ninguém esteja interessado no que é posto diante de si. Ele impõe-se já não à consciência religiosa do burguês (consubstanciado no seu privilégio automóvel, como antes o era o cavaleiro, face ao peão), nem apelando, por isso, a qualquer sentimento de culpa, mas ao seu sentido de propriedade e à sua prudência.


Assim, o assédio do arrumador, ao impor um serviço que ninguém lhe pediu e que na maior parte dos casos não tem qualquer utilidade, conquista uma espécie de dignidade e de estatuto entre o profissional e o mafioso.

Na prática, é o cobrador de impostos dum Estado paralelo, laico e inspirado na ideologia dos direitos do homem.

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