sexta-feira, 2 de julho de 2010

JESUITISMO ECONÓMICO





Quando algum esquerdismo dizia, há uns tempos atrás, “os ricos que paguem a crise”, interpretavam populisticamente o sentimento de que a crise é sempre em benefício dos ricos e de que eles podem e devem, por isso, pagá-la.

Embora esse sentimento corresponda no fundo à ideia de que a igualdade não existe de facto e de que o reino da justiça ainda não chegou, ninguém honestamente e no seu bom juízo pode defender aquela política. Na sua simplicidade, é mais um exorcismo ou uma fórmula mágica do que uma norma de conduta.

Porém, se a complexidade (não à maneira artificial que o homem pode controlar e compreender porque é o autor desse artificialismo, nem sequer à maneira dum ser vivo, porque o social é mais complexo ainda) de que fazemos parte não se deixa penetrar através de fórmulas como aquela e, portanto, nunca muda conforme a consciência dos que as aplicam, tempos propícios há para que essa mesma mágica produza grandes e poderosos efeitos, como já se viu entre nós. É o papel do erro ( e da juvenilidade ) no processo vital.

Sem menosprezar, pois, as frases encantatórias, não seria inútil clarificar um pouco a questão da irracionalidade daquela frase em concreto, que esconde, de facto, o fantasma da violência.

Pierre Ricoeur, numa entrevista ao Nouvel Observateur, em 2000, dizia que tínhamos de reencontrar o verdadeiro sentido da discussão pública e uma sã gestão do diferendo. Coisas, como se sabe, que a problemática dos partidos por completo desvirtuou.

Porque o que a sociedade não é, nem por decreto, é homogénea e os interesses são uma espécie de geologia ou de campo de forças que é preciso pesar e harmonizar, com a violência sempre como medida de fracasso. Violência que a sociedade política existe precisamente para exorcizar, mas que se viu erigida em alternativa filosófica, contra a verdadeira política, pelo idealismo do século XIX, o qual pensou poder compreender a sociedade dentro dum sistema.

Mas, derrotado o arcaísmo romântico, temos um novo idealismo de que são representantes os novos filósofos, conhecidos por economistas, cujo papel, por outro lado, na fabricação do consenso necessário, devido à superstição do cientismo, não pode ser nunca suficientemente valorizado.

E aqui temos o campo propício para um novo jesuitismo...


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