"O 'povo do livro', nos nossos dias, é sem contestação o Islão. A ausência geral de cultura profana, de ensino superior e de sistemas de valores científicos e técnicos dão aí ao Corão uma centralidade, um poder na vida quotidiana, um monopólio referencial quase obsoleto no judaísmo do fim do século XX. (Aí ainda, a acerba hostilidade entre Judeus e Árabes não é sem paradoxos)."
"Les Logocrates" (George Steiner)
O Livro salvou a identidade na Diáspora do judaísmo, o que permitiu o mais fecundo movimento de emulação da história. É pouco dizer que a nossa cultura não se compreende sem a raiz judaica, quase tão importante, através do Cristianismo, como a greco-latina, porque a própria disputa entre tradições contribuiu para acelerar e refinar o processo civilizacional (na verdade, não sem alguns recuos de barbárie, no século passado).
O que faz a originalidade do Islamismo e o fracasso do seu "aggiornamento" é a falta dum confronto histórico como esse, a um nível mais profundo, do que o das diferenças entre "primos" de religião.
A "centralidade" do Corão de que fala Steiner representa isso mesmo e aproxima as sociedades muçulmanas mais típicas da sociedade de massas. O poder da referência corânica na vida quotidiana está, assim, intimamente ligado à penetração da tecnologia que encurtará infalivelmente a distância em relação a um tal modelo.
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