“Não há chave melhor do que o ascenso de ‘The
Reader’s Digest’ para a dissolução de formas e para o crescendo das experiências
de segunda-mão na América do século vinte. Aquela, a revista mais popular nos
Estados Unidos, ofereceu-se não como um ‘original’, mas como um resumo. A sombra
vende mais do que a substância. Encurtar e resumir já não é um dispositivo para
levar o leitor a um original que lhe dará aquilo que ele quer. O próprio resumo
é o que ele quer. A sombra tornou-se a substância.”
“The Image” (Daniel Boorstin)
Tudo se
recicla, como se o filão da inventividade se tivesse esgotado. Mas não é o
caso. Acontece que a tecnologia e o digital nos permitem reinterpretar os temas
do passado segundo uma gama infindável de possibilidades. E é mais fácil variar
sobre o que já está feito do que criar alguma coisa de novo.
A música é
talvez o exemplo mais flagrante. Já não há canções datadas. Novos timbres,
novos ritmos, todos os parâmetros podem ser modificados numa consola para nos
dar um novo consumível que pode, por sua vez, vir a ser citado e reciclado.
Quem é que quer
ler “O Vermelho e o Negro” se pode ter além das versões cinematográfica e televisiva,
o “essencial” da obra em meia dúzia de páginas? O ideal da “Reader’s” é
proporcionar a todos a cultura sintética que nos mantenha informados sem perder
tempo. O prazer é demasiado importante para ser ocupado com obrigações
culturais. É o pensamento do general americano em “Lipstick on your collar”, cujo único motivo para ir ao teatro é o
de “chaperonar” a sua sobrinha. Nada mais natural do que a evolução observada
por Boorstin da substância para a sua sombra.
A substância
precisa cada vez mais de homens de fé, por se ter tornado tão contrária ao
espírito do tempo. Enquanto os simulacros e a reciclagem são feitos à medida da
nossa superficialidade.
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