segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

A ORIGEM DAS ESPÉCIES


Bernard Madoff

"As empresas costumavam ser dirigidas por executivos tradicionais que compreendiam o produto e como ele era produzido e vendido, quer fossem automóveis ou petróleo. Mas com o ascenso da 'cultura do dinheiro' ('money culture'), muitas empresas, especialmente as companhias petrolíferas, descobriram que podiam ganhar mais dinheiro investindo e comercializando os seus excedentes de capital do que fazendo o que as companhias tradicionalmente faziam – prospectar petróleo. Engenheiros e vendedores foram substituídos por analistas e contabilistas do mercado financeiro internacional. Esta nova gente começou a dirigir as empresas. O que, naturalmente, nos leva a interrogarmo-nos sobre quem é que se vai preocupar com o estaminé?"

"The Dreams of Reason" (Heinz Pagels)


Sendo o dinheiro essencialmente informação, o que se negoceia, a cada vez maior velocidade, não são bens e serviços, mas isso mesmo: informação. Ganha-se a cada nova transacção sobre uma expectativa: a de que o carrossel continue a girar. Mas "a uma dada altura, a confiança é abalada e muita gente sofre com isso." Foi assim quando rebentou a "bolha" de Outubro de 1987 e repetiu-se vinte e um anos depois.

Se há uma lição a tirar desta história, é que vinte anos de "regabofe" valem bem a pena, mesmo se um ou outro septuagenário, como Bernard Madoff, acaba por passar o resto do tempo atrás das grades. Mas, provavelmente, esses dirão, como a futura mulher de D. João IV, que mais vale ser rainha uma hora do que duquesa toda a vida. Mesmo os que acreditam que este é o melhor dos sistemas possíveis não têm razões para se preocuparem, porque as crises não só são expectáveis, como muito provavelmente fortalecem o sistema.

Além disso, a "cultura do dinheiro" tem a seu favor uma das principais facetas do espírito da época: ela justifica-se a si mesmo só porque funciona (pelo menos de vinte em vinte anos).

Por isso, já estamos a assistir ao regresso das boas e velhas práticas que levaram os "mais fracos" à ruína.

2 comentários:

Anónimo disse...

A sua reflexão é aterradora porque me tira um pouco de confiança (ou será esperança?) em que aprendamos e não repitamos os erros.
Também a peça «A cidade» me fez rir com ar aterrado. Aristófanes actualíssimo?
É tão difícil gerir a informação nas nossas vidas, como é no dinheiro?
As pessoas sabedoras e experimentadas são unânimes no reconhecimento do valor da dúvida, todavia já não sei se o valor não estará no desconforto que acarreta e não na coragem de continuar a acreditar.

Maria Helena

José Ames disse...

Poderemos aprender com os nossos excessos, com a nossa ganância?
É preciso que as instituições não nos dêem a oportunidade para nos exercermos nesse sentido. Mas quando elas incentivam em vez de inibir, a esperança só pode ser utópica. Pelo menos enquanto não formos obrigados a "parar".
A coragem é um valor, o masoquismo é da ordem do prazer.