Florbela Espanca (1894/1930)
(na sua certidão de óbito: nevrose)
"Um doente não é um neurótico em si, mas torna-se um porque está envolvido numa situação dada à qual é incapaz de fazer face. A nossa civilização complexa confronta-nos com uma grande variedade de situações. Mesmo um indivíduo que tenha tido uma infância infeliz pode adaptar-se a um certo modo de vida e, se consegue nele manter-se, nunca fará uma neurose. Um jovem sensível virado para a vida interior, interessando-se pela música e pela literatura, teria estado completamente desadaptado numa cidade da fronteira americana do século passado. Teria sido um objecto de ridículo e não teria podido satisfazer os seus interesses. A mesma pessoa na sociedade literária de fim de século de Paris teria gozado duma grande estima e de altas protecções..."
"Principes de Psychanalyse" (Franz Alexander)
Se a neurose é uma resposta à desadaptação, devia ser tão antiga como homem. E nesse sentido abundam os que pensam ser a religião uma neurose colectiva.
Mas a palavra é moderna e os homens de antanho não pensariam decerto que houvesse tal coisa como uma desadaptação. Para isso, foram precisos alguns séculos de elaboração da "natureza humana", culminando no sujeito ocidental.
Quando o homem mal se distinguia do social, que é a sua natureza, é provável que só conhecesse as doenças do corpo e que todas as doenças psíquicas fossem apenas pecados ou manifestações da presença gloriosa de um deus.
A epilepsia de que sofria Júlio César não o diminuía aos olhos dos outros. Era a posse pelo deus que a tornava o mal sagrado, ao mesmo tempo privilégio e terror.
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