terça-feira, 16 de julho de 2013

O CEREJAL

 

"Ania (abraça Varia docemente) - Varia, ele pediu-te em casamento? (Varia abana a cabeça). Mas, então! ele ama-te...por que é que não se explicam? De que estão à espera?"

"La Cerisaie" (Anton Tchekhov)

Nestas conversas quase sussuradas parece que não se passa nada. Estas personagens reúnem-se, mais uma vez, num lugar familiar, longe da cidade, onde se forja o seu destino. O cerejal, símbolo da infância, vai ter que ser vendido.

É uma espécie de ajuste de contas entre os sonhadores (de uma classe que vai perder tudo na Revolução) e a realidade.

A peça envolve-nos neste clima de 'dolce far niente' já condenado. Como se existisse um acordo tácito entre todos, os novos deixam-se impregnar pelo mesmo fatalismo e desistem (às vezes, depois da veleidade de uma ambição: a de ser artista, ou homem de ciência, de mudar o mundo à antiga maneira). Até o optimismo sexual de que fala o autor de "O mapa e o Território" desertou.

A pergunta de Ania é recorrente, porque nada de novo se pode passar. Os 'promessi' hão-de permanecer assim no seu estado de crisálida. Aquelas vidas estão esgotadas. Aquela doçura é como a do 'Ancien Régime'. Será doce apenas quando se perdeu e porque se perdeu.

Nada se passa e tudo se revolve, como numa tempestade longínqua.

Agora que sabemos a história toda, não nos é permitido recorrer a nenhum princípio de utilidade. O cerejal simbólico testemunha a mudança dos sonhos.

 

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