sábado, 11 de agosto de 2007

UMA ASSEMBLEIA




Tenho de esperar na bicha para assinar o livro das presenças, e em todos os rostos mais assíduos nestas lides exulta o mesmo prazer grávido e a febre dos grandes momentos.

A mole desta vez não tem o aspecto ameaçador da guerra entre partidos. Houve um certo desgaste da política, mas para além disso, adivinha-se o interesse comum. Ninguém tem soluções, mas a disposição de jogar a força é visível em muitos. A greve é a grande questão por decidir para os impacientes que, desprezando as considerações estratégicas e o estudo da situação, querem cavalgar a indignação geral. Há outros que vieram só para fazer frente a esses e evitar que sejam postos em causa certos princípios.

Mas o verdadeiro conflito desenha-se com o traço grosseiro que a multidão põe em tudo. Os oradores habituados ao microfone, transfigurados por aquela poderosa expectativa que sabem lisonjear, sem medo de encontrar hostilidade ou incompreensão, desancam, uns atrás dos outros, nas duas figuras patéticas da direcção, condenadas ao silêncio pela impotência e pelo desprezo doutrinário das assembleias.

Cada intervenção que impunemente excita e envenena a discussão, sempre tentada como álibi das emoções, faz inscrever novos oradores. O pior espectáculo da anarquia – o presidente da AG abandonou a mesa ao primeiro convite – não é a sala, ainda assim. As pessoas têm que obedecer à cadeira e à ordem imposta das filas. Os apupos que se ouvem não chegam para transtornar o grande animal perplexo.

A partir de certa altura, quando se vê que a discussão não é possível e não vão ser tomadas decisões, a massa fica ainda por causa do espectáculo. Para se deleitar num dos seus, sem hábito de falar nas reuniões, mas com o instinto seguro do que agrada à multidão.

Nessa noite abominei a demagogia e vi até que ponto ela nos enredava a todos.

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