sexta-feira, 27 de julho de 2012

NARCISO



"O objecto amado é simplesmente o que partilhou uma experiência ao mesmo tempo, narcisisticamente; e o desejo de estar próximo do objecto amado não é devido num primeiro tempo à ideia de o possuir, mas simplesmente à de deixar as duas experiências se compararem, como reflexos em diferentes espelhos."

"The Alexandria Quartet" (Lawrence Durrell)


Era Lacan que dizia que não há relação. Narciso revê-se nos espelhos e ama tudo o que devolve a sua imagem. Quando a opinião corrente parece encontrar uma justificação para tudo no puro egoísmo, esta explicação do amor não devia oferecer qualquer dificuldade.

Mas tudo depende de identificarmos o narcisismo com o ego. E isso é o que não se pode. Não há qualquer 'interesse'  nos motivos deste herói, filho de um deus-rio. Aliás, a sua atracção por si próprio ( ou pela sua imagem ) é um castigo de Némesis que lhe há-de provocar a morte. Como se vê, todo o contrário do egoísmo que, até certo ponto, se deve considerar natural.

Tal como na grande obra de Musil, a paixão dum pelo outro entre Ulrich e Ágata, na sua impossibilidade de ser 'concretizada', nos remete para a morte como única perfeição da admiração mútua, Durrell, através da sua personagem Justine, repete-nos que aquilo a que chamamos amor é uma precaução contra a sentença de Némesis.

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