sexta-feira, 13 de julho de 2012

A ARTE DA DESENVOLTURA



Um filme que podia ser a súmula antecipada da maneira de fazer cinema de Godard é, sem dúvida, "Le gai savoir", realizado ainda no rescaldo de Maio de 68.

Num estúdio de televisão reduzido a um fundo negro, dois descendentes de Rousseau e da revolução maoista (Jean-Pierre Léaud e Juliet Berto) travam um diálogo sincopado, feito de jogos de palavras que "flashes" da banda desenhada ou de cenas de rua em Paris vêm interromper.

Antes de César Monteiro e da sua "Branca de Neve", o espectador fica muitas vezes sem qualquer imagem e é com bom motivo que Vincent Canby, na "New York Times Review" comenta: "Suspeito que quando Godard conseguir o seu filme mais revolucionário, terá descoberto uma maneira de dispensar a câmara, o filme, o projector, o écrã e, talvez, até a audiência."

Inicialmente o filme seria um projecto da ORTF sobre o "Emílio" de Jean-Jacques e a sua teoria da educação. Perante o resultado tão "pessoal" da atitude do cineasta, esse projecto acabou por ser mais um filme de Godard, em que Rousseau é um mero pretexto.

Será que poderemos chamar a este estranho artefacto um trabalho de "desconstrução" sobre a linguagem e o cinema? Mas o cinema não pode ser filosofia.

Falta à obra de Godard, não a coerência (ele repete a mesma fórmula de filme para filme, assegurando um estilo, ou pelo menos, uma marca distintiva), mas a capacidade de nos dizer alguma coisa para além do seu formalismo de adolescente revoltado.
 

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