Paul Cézanne (1839-1906)
"Entre esses quadros, alguns dos quais pareciam os mais ridículos às pessoas mundanas interessavam-me mais do que os outros ao recrearem essas ilusões de óptica que nos provam que não identificaríamos os objectos se não fizéssemos intervir o raciocínio. Quantas vezes de carro não descobrimos uma comprida rua clara que começa a alguns metros de nós, quando foi apenas uma parede violentamente iluminada que nos deu a miragem da profundidade! Então, não é lógico, não por artifício de simbolismo mas por sincero retorno à própria raiz da impressão, representar uma coisa por essa outra que, no relâmpago de uma primeira ilusão, nós tomámos por ela?"
"Le Côté de Guermantes" (Marcel Proust)
Proust entendeu perfeitamente a pintura moderna nestas linhas. Aquele raciocínio que nos permite a identificação das coisas é o inimigo da arte depois de Cézanne. Por isso tantos pintores encontraram a inspiração no titubear das crianças e nos primitivos.
Mas como a variação das formas "ingénuas" é limitada, foi preciso dar outro passo para algo que já não tem nada a ver com a percepção.
O "raciocínio" continua proscrito, por infecundo, e a própria imaginação não é tão livre como promete. O automatismo dos dadaístas e dos surrealistas já não garante a diferença. O passo decisivo foi tornar o sistema da arte (que inclui as obras do passado, os museus, a internet e a bolsa de valores) na única fonte de inspiração.
Mais virgem do que o inconsciente do artista individual é o efeito da reacção em cadeia das obras de arte "conversando" umas com as outras.
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