"A forma da madeira, por exemplo, é modificada quando se faz uma mesa. A mesa não deixa de ser de madeira, coisa sensível e ordinária. Mas a partir do momento em que ela entra em cena como mercadoria, transforma-se numa coisa supra-sensível. Ela não está apenas assente com os pés em terra, mas põe-se de cabeça para baixo, face a todas as outras mercadorias, e sai da sua cabecinha de madeira toda uma série de quimeras que nos surpreendem ainda mais do que, sem nada perguntar a ninguém, se ela se pusesse a dançar."
"O Capital" (Karl Marx, citado por Jacques Derrida em "Spectres de Marx")
Derrida recorda a vaga espiritista que se espalhou na Europa, na segunda metade do século XIX, o interesse de Max Stirner, por exemplo, pelos "Mistérios de Paris" de Eugène de Sue e as "tentações espiritistas de Victor Hugo", para situar o devaneio fantasmático, naquela passagem, do autor de "O Capital".
Porque não se trata apenas de uma abstracção, segundo a qual devêssemos pensar o objecto e o seu "valor de uso", enquanto mercadoria. Marx sente a necessidade de efabular uma vida própria, enquanto "espírito", desse alter ego da mesa.
E isso era necessário, talvez, para transmitir a essa metamorfose do "valor de uso" em "valor de troca" a qualidade moral adequada à visão profética da obra.
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