(Le Lever du roi Louis XIV)
"Os ministros tinham conseguido persuadir o rei do abaixamento de tudo o que fosse elevado, e que recusar-lhes esse tratamento era menosprezar a sua autoridade e o seu serviço de que eles eram os órgãos porque, de outro modo e por eles mesmos, não eram nada. O rei, seduzido por este pretenso reflexo de grandeza sobre si próprio, explicou-se tão rudemente a este respeito, que não houve outra maneira senão inclinar-se a este novo estilo, ou deixar o serviço, e cair ao mesmo tempo, os que deixavam, e mesmo os que não serviam, na acintosa desgraça do rei e sob a perseguição dos ministros, encontrando-se as ocasiões disso a todo o momento."
"Mémoires" (Saint-Simon, citado em "Le Côté de Guermantes")
Luís XIV, o rei mais poderoso da época, é nesta passagem do grande memorialista, o exemplo da ductilidade do poder sempre no sentido de se extremar.
A proverbial ignorância do monarca não o impedia de pretender que o considerassem como o deus que ilumina o mundo.
A astúcia de que deram provas os ministros burgueses fê-los beneficiar da degradação da nobreza e, agarrados à real figura de proa, guiaram a barca do Estado nos caminhos do monstro burocrático em que se tornou depois.
Luís, que era beato (porque mesmo o maior poder precisa encontrar o seu princípio fora de si próprio), não o era o suficiente para dispensar a tirania dos médicos.
E mesmo um absolutista vaidoso se tinha que render à fita métrica. Por muito que disputasse as dimensões de uma janela, a medida punha fim à régia pretensão.
É o exemplo oposto do escravo no "Menon" (Platão).
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