quinta-feira, 2 de março de 2006

O QUE A IMAGEM ACABA


Stendhal (1783/1842)


"A dificuldade, o desgosto profundo de pintar mal e de assim estragar uma celeste recordação em que o
tema ultrapassa o dito (*) faz-me verdadeiramente sentir mal em vez de ter prazer em escrever sobre ela."

"Vie de Henry Brulard" (Stendhal)

Nesta cultura da imagem que é a nossa, em que supostamente tudo é dito, sem resto, uma imagem valendo mil discursos, a relutância de Stendhal em confiar à escrita o mais pessoal e intraduzível da experiência melhor ainda se compreende.

Porque é precisamente essa falência da escrita em ser inteiramente fiel ao vivido que permite o espaço da evocação.

Não há nada como uma fotografia, um vídeo ou um filme para nos roubar a memória.

(*) citação dum verso de Francisco I sobre Petrarca:
"La parole est toujours reprimée
Quand la parole surmonte le disant."

0 comentários: