quarta-feira, 10 de outubro de 2007

DUELO DE MÁSCARAS



"Sleuth" (1972), de Joseph Manckiewicz, é um filme sobre o desprezo, o mais dogmático e inconciliável dos desprezos: o desprezo de casta.

Dois dos maiores actores do cinema moderno (Olivier e Caine) pedem meças um ao outro neste duelo de classes, através do jogo, até à morte. Como aquele jogo de mãos das crianças em que se perde rapidamente o controle.

Andrew (Olivier), velho senhor da gentry, colecciona autómatos e escreve policiais. Milo (Caine), cabeleireiro, de ascendência italiana, é jovem e começa a singrar na vida.

O primeiro odeia o segundo pelo seu sucesso, mas, sobretudo, por lhe ter roubado a mulher. Convida-o para a sua mansão no campo e facilmente o convence de que não poderá sustentar o luxo da sua amante, pelo que o alicia a um assalto simulado ao cofre das jóias.

Mas, obtido o flagrante delito, Andrew leva o seu jogo ao extremo e depois de humilhar, de uma forma execrável, o seu rival "mata-o" com um tiro de pólvora seca.

Quando vem a si do desmaio, Milo regressa a casa de Andrew, disfarçado de detective, incriminando-o com pistas fabricadas e depois de se revelar, humilhando-o por sua vez, fazendo-lhe crer que vai ser acusado pela morte da amante finlandesa que ele, Milo, teria assassinado, depois de conseguir que traísse o velho e lhe confessasse a sua impotência.

Andrew acaba por matar Milo, deveras, por não acreditar que ele tenha informado a polícia. Mas já se vêem as luzes do carro que parou à sua porta.

Milo, ao acordar do seu desmaio, poderia ter-se simplesmente permitido dar uma sova monumental a quem lhe pregou um susto de morte e com ele jogou como o gato com o rato.

Mas, com isso, confirmaria o lorde nos seus preconceitos de nascimento e privilégios. Era preciso jogar com as suas armas e consumar uma vingança de inteligência.

É Andrew que acaba por proceder como um burguês convencional, defendendo a tiro a sua honra e a sua virilidade.

Manckiewicz, grande amante do teatro e do artificio, deu-nos uma comédia genial, em que os papéis se invertem e as máscaras caem para mostrar outras máscaras.

Como a significar que nada é o que parece, a última imagem é a de um palco de teatro.

Laurence Olivier: um portento.

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