quinta-feira, 28 de setembro de 2017

A IMPORTÂNCIA DO CABELO



"O pobre homem, pesado e mole, não conseguia, nesta noite suprema da monarquia, estar de pé até ao fim; dormira uma hora, e acabara de levantar-se. Via-se pelo penteado, liso e desfrisado de um lado. Foi então que se pôde avaliar o perigo dessas modas pérfidas na Revolução. Quem pode estar certo, em tais crises, de ter à mão o valete cabeleireiro?...Assim estava ele, e assim os ineptos o deixaram descer, mostrando-o e passeando-o. Para cúmulo do mau augúrio, estava de roxo, cor que é o luto dos reis; era, aqui, o luto da realeza."

"História da Revolução Francesa" (Jules Michelet)

Nas horas que precedem o 10 de Agosto de 1792 que iniciou o compasso trágico da Revolução e ditou a sorte do rei, este não estava à altura dos acontecimentos.

Mais uma vez, a importância do detalhe, do minúsculo na grande história. É ainda a tese de Pascal e do "nariz de Cleópatra". Este desfrisado da cabeleira de Luís XVI, a balofa figura que ganhava coragem só na religião. Michelet diz, noutro passo: "A conversa tomava uma feição desagradável; toda a gente estava emocionada, excepto talvez o rei, que acabava de deixar o seu confessor, tendo posto a consciência em ordem e não se preocupando muito com o que poderia acontecer."

A fatalidade está na cabeça dos homens apenas. A importância de cada gesto, que nos parece de antemão poder ser delimitada, atribuindo-se a este a força e àquele a pusilanimidade, só seria definitiva se os homens nunca se excedessem e se não fossem, de bom ou de mau grado, arrastados pela onda que cavalgam ou que os submerge.

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