sexta-feira, 30 de novembro de 2007

A LIÇÃO CHINESA


"Chung Kuo Cina" (1972-Michelangelo Antonioni)



Trinta anos depois, com a emergência da superpotência económica e as consequentes pressões sobre o seu perfil ideológico, ver a reportagem de Antonioni sobre a China (1972 -"Chung Kuo Cina") pode ser uma experiência didáctica.

Quando filmou os chineses nas suas ocupações, passeando uma câmara exótica pela paisagem humana que parece não ter sofrido recentemente as inclemências da Revolução Cultural e do Grande Salto em Frente, mostrando as tradicionais virtudes de paciência e sabedoria milenares, uma coisa nos impressiona em primeiro lugar, que é a disciplina omnipresente que a todos afecta, desde os operários e camponeses às criancinhas nas escolas, que nem sequer "costumam ter caprichos".

Ora essa ordem, presente em toda a parte, que afecta os gestos e as palavras (discute-se a produção entre as citações do livrinho vermelho) e parece transformar o país numa grande fábrica, impõe-se como uma necessidade antes de todas as outras, perante a ameaça, sempre à espreita, da fome e da violência, e toda a tentativa de comparar essa sociedade com a da Europa moderna e a problemática da sua organização, nem sequer é concebível.

O casamento da filosofia alemã com o Império do Meio tal como chegou ao século XX parece acidental e pouco terá sobrevivido de Hegel e dos seus discípulos nos aforismos do Grande Timoneiro. Mas a ideia do Estado Todo-Poderoso e de partido revolucionário, a que Lenine deu a forma rematada, desempenhou decerto um grande papel no esforço centralizador para transformar a China. E se a disciplina fabril, à escala do país, era necessária nos anos 70, sabemos como as coisas mudaram desde então, graças à nova política económica, para esperar grandes novidades nesse capítulo.

Significativamente, o partido é a última coisa a mudar.

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