quinta-feira, 30 de abril de 2015

O PANTEÃO

(Le Panthéon de Rome sur une gravure du XVIIe s.)

"Sem, no momento adequado e graças a certas circunstâncias históricas, uma burocracia eclesiástica e politicamente eficaz, dificilmente teríamos hoje quaisquer traços do cristianismo..."


" O Homem Sem Qualidades" (Robert Musil)



Um romance coral como este permite ao seu autor harmonizar o que, à primeira vista,  poderia parecer uma contradição entre o homem e a obra. Ou, por outras palavras, manter a tensão entre os dois pólos, quando ambos são verdadeiros.

O pensamento citado é expresso por Tuzzi, um conselheiro de Estado nos antípodas do nosso Acácio, que leva muito a sério o poder que exerce e o funda numa perspectiva histórica que não pode reunir o consenso. Tuzzi dirige-se a Ulrich, o 'homem sem qualidades', que o 'compreende', como 'compreenderia' quem pensasse o contrário.

A burocracia que teria 'transportado' o Cristianismo até aos nossos dias não corresponde inteiramente à imagem material de um vaso (como na 'Viagem ao centro da Terra', de Henry Levin, quando é expulso pelo Etna) ou de uma nave espacial. A razão disso é que (McLuhan dixit) o 'medium' é a mensagem.

Se a ideia cristã não tivesse sido salva fora do 'aparelho', o que provavelmente teríamos seria um império de um tipo especial (pois se reclamava do espírito), vencido pelo tempo e soterrado para sempre.

O verdadeiro guardião do templo tampouco terá sido o culto e os costumes tradicionais, pois sabemos bem de mais quanto é fácil mudarmos pelas novas ideias e técnicas e, até, pelos novos hábitos...

Pensando bem, a sobrevivência do Cristianismo na 'Era da Técnica' devía de facto maravilhar-nos e causar o mesmo espanto que em nós provoca o Panteão de Marcus Agripa, quase incólume, no centro de Roma, ou Santa Sofia, em Istambul.


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