quinta-feira, 23 de novembro de 2006

RETÓRICA CONTRA RETÓRICA




Albert Hirschman é citado hoje num artigo de EPC no "Público".

Este sociólogo tem o mérito de introduzir alguma racionalidade no incipiente debate político que sucedeu ao colapso soviético.

Nunca é demais lembrar que a retórica faz parte da política, e que desde a Antiguidade Clássica se sabe que as questões de forma são decisivas na persuasão dos homens.

AH define uma retórica reaccionária, através de três teses:

a da futilidade (nada mudará, se não mudarem as estruturas), a da perversidade ( as melhores intenções podem ter efeitos indesejados) e a do risco (uma reforma mais radical prejudicará uma anterior reforma, conquistada com muito esforço) e compara-a com a retórica do partido contrário, encontrando entre as duas muita coisa em comum.

Mas porque há uma verdade, ou meia verdade naquela retórica, os amigos do progresso terão de ter em conta os seus argumentos e, se possível, antecipá-los e aprofundá-los.

Com efeito, a tese da futilidade é o argumento utilizado por aqueles que se opõem a todas as reformas, com a desculpa do que o que é preciso é uma Revolução. É o eterno adiamento da luta pela justiça, lapidarmente resumido por Alain: "Os Direitos do Homem suspendem o direito até que termine a guerra pelo direito. Assim, todos estão de acordo, e a discussão académica condu-los a discutir tão-só as nuances."

Por outro lado, negar todo e qualquer efeito perverso é presumir que os homens dominam o conhecimento de todas as consequências dos seus actos, o que está longe de ser verdade. Mas Hirschman cita Racine, para nos precaver contra o vício oposto, de tudo querer prever:

"Tant de prudence entraîne trop de soin. Je ne sais point prévoir les malheurs de si loin." (Andromaque)

A outra ideia depende, como é óbvio, da real importância das medidas em curso e de existir uma verdadeira incompatibilidade.

Em distinguir, pois, a falácia por detrás da razão aparente é que está a arte do polemista.

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