sábado, 23 de agosto de 2014

TEOREMA

Teorema" (1968-Pier Paolo Pasolini)

A idade não basta para explicar o respeito. É preciso ainda a distância dos sentimentos e uma soberana indiferença pelo que possam dar os jovens de pessoal. Todo o contrário, como se vê, não só do que lisonjeia a juventude por amor ou interesse, mas também da atitude preocupada dum pai. Aquilo que é livre e parece completamente não precisar de nós é o que mais atrai num jovem ambicioso. Mesmo as crianças perdem muito do seu encanto quando se tornam insistentes e mimalhas. No entanto, quem mais do que elas está à mercê da nossa vontade? Mais duma vez também vi o homem maduro e distante mostrar que a indiferença é um jogo entre ele e as suas paixões. O jovem é, naturalmente, sedutor. Mas quem o recebe sem guarda de fronteira perde-o e perde-se. Talvez que o milagre de "Teorema" seja o dum jovem que sabe o que quer e para onde vai. Quem pode resistir à aliança do espírito e da graça? É preciso, porém, que a juventude aprenda. E o modelo vivo é o melhor mestre. Não é difícil de ver então que o espectáculo dum homem que se domina perfeitamente, que se move como um rei entre os outros homens, porque é senhor das suas paixões, é o que mais aprecia o animal rebelde que apenas começou a pensar. Admirar é imitar.

O respeito fica quando a admiração bateu as asas. Mas uma roupagem de cortesia e um pudor nunca ofendido no riso e na intimidade são necessários. Seguramo-nos uns aos outros, mesmo quando o tempo esbateu a diferença de idades. Compreendo assim que certas fidelidades sejam muito mais do que a comunidade de ideias. De resto, as opiniões políticas, se vistas realmente pelo que são, sem parti pris, são o material neutro de que se cimenta a relação. Bem antes é a atitude para consigo e para com os outros, a moral, numa palavra, que é o fundamento verdadeiro da política. As construções ideológicas tornam-nos presa dum jogo político complexo e artificial. A isso podem resistir as relações veneráveis. Desde que a inteligência vá à frente a desbravar o caminho.

O homem respeitado liga-me a esse olhar exigente que não pisca. Suponho que um partido nunca terá a vida necessária para obrigar assim alguém a uma moral. Mais, a expectativa dos outros, satisfeita no passado e sempre convencida do seu direito é uma força básica da personalidade. Não se pode mudar de testemunhas, como se muda ou se pode mudar de ideias. Mas que conflito não viverá a alma quando os contemporâneos mais próximos obrigarem as ideias do passado a comparecer em tribunal?

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