quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

A JUSTIÇA ESPECTÁCULO

Federico Fellini

"É por isso que o tempo da autoridade judiciária, o tempo de uma longa retrospectiva, diverge do tempo do poder executivo, apanhado num presente complexo que a decisão do juiz vem ainda complicar mais, parecendo ser do campo dessas escavações arqueológicas que bloqueiam os projectos dos construtores.

(Michel Rouger)

Vem-me logo à ideia a cena dos frescos soterrados descobertos pelas excavações do metro no "Roma" de Fellini. Suponho que nem sempre esse escrúpulo e essa sensibilidade histórica tenham sido motivo do atraso das obras, mas a cena dá uma ideia de que o passado não é apenas memória dos indivíduos e pode também ressurgir como um problema actual de identidade colectiva.

A função 'retrospectiva' da justiça de que se trata aqui (na verdade, integradora do passado e do presente no todo da dimensão humana) é, evidentemente, utópica e levaria à historização e à relativização do acto concreto que constitui a injustiça. O juiz deveria, neste sentido, concorrer com Deus.

Toda a justiça é falhada, segundo esta ideia, e a urgência fala sempre mais alto. Temos, aliás, alguma percepção do que significaria esta justiça 'divina' no arremedo que constitui o 'politicamente correcto', o qual não é necessariamente melhor do que o que os marxistas chamam de justiça de classe...

Todavia, os tempos são mais propícios a uma justiça mediatizada que faz fogo tanto do presente como do passado. O Grande Animal (platónico) é, assim, o verdadeiro juiz.

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