sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

A QUESTÃO JUDAICA



"A pretensa questão judaica desvanecer-se-ia num momento se os Judeus se decidissem a falar hebreu, a retomar os seus antigos patrónimos e a envergar o antigo hábito oriental (...)"
"O Homem Sem Qualidades" (Robert Musil)

A opinião é a de um conservador e membro do governo da Cacolândia, o conde de Leinsdorff. A simplicidade dessa opinião é desarmante.

A obra de Musil foi publicada entre 1930 e 1943, uns anos antes do nascimento do Estado de Israel. Com este acontecimento, a realidade veio provar, de certa maneira, que a 'questão judaica' podia ter uma solução. Uma emenda que para muitos foi 'pior do que o soneto'.

Porque a figura do judeu como 'corpo estranho' inassimilável sempre foi um desafio para essa crença na liberdade individual que gostamos de dizer que é própria da nossa cultura política. O estigma é o da sociedade secreta com a sua estratégia que nunca se confunde com a das decisões democráticas. É também este o problema da maçonaria e da organização marxista-leninista. Seríamos, contudo, ingénuos se não admitíssemos que a democracia, sem a mediação dos vários grupos políticos ou profissionais, de todo o tipo de organizações e poderes intermédios seria uma abstracção.

O que é que distingue 'o povo do Livro', na sua diáspora, dos outros grupos sociais? O que não é assimilável é essa vontade de viver entre os 'gentios' como se fossem os eleitos de que fala o Antigo Testamento. Mas essa distinção naturalmente que sofreu uma reviravolta com a criação do Estado de Israel.

O Estado judaico talvez tenha acabado com a 'questão judaica', ou modificado os seus termos. Mas o que salta aos olhos é que esse Estado não é igual aos outros e continua a ser investido com um mandato divino, como as comunidades judaicas que encontraram um 'modus vivendi' entre os gentios e até acabaram por ser patriotas, fora do Livro.

Esse Estado, plantado no meio das nações árabes, está prisioneiro da sua política de defesa e a religião é mais do que nunca um dos baluartes da nação israelita, nesta segunda vida da 'questão judaica'.

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