quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

O ERRO DE PTOLOMEU

Friedrich Hayek (1899/1992)



"As pessoas nem sempre se dão bem conta disso, e por hábito justifica-se a delegação pelo carácter técnico da tarefa. Mas tal não significa que só o detalhe técnico seja delegado, nem mesmo que a inaptidão dos parlamentos para compreender os detalhes técnicos esteja na origem da dificuldade.

(...) No entanto, ninguém até agora sugeriu, com seriedade, que a legislação civil seja delegada a um corpo de especialistas. O facto é que nestes domínios a legislação não vai além das regras gerais sobre as quais é possível que uma maioria se entenda, enquanto que no domínio económico os interesses a conciliar são tão divergentes que não há qualquer hipótese de se chegar verdadeiramente a um acordo sobre eles numa assembleia democrática."

"La route de la servitude" (Friedrich Hayek)

Hayek verbera a "prática de delegações massivas e indiscriminadas" a que o Parlamento britânico recorria, nos anos trinta, segundo o relatório Donoughmore e refere esta frase, ali, inocentemente reveladora:" se o Parlamento não delegasse o poder legislativo, não poderia votar as leis exigidas pela opinião pública."

E o dilema, em democracia, é então entregar a direcção da economia e de outras áreas governamentais a comissões especializadas e a organismos separados (o que Hayek chama de planismo), sob o pretexto da tecnicidade das matérias, ou deixar as forças económicas e a iniciativa dos indivíduos entregues a si próprios, desde que respeitem os limites da lei.

Aqui só podemos julgar pela experiência. E sabemos que a necessidade de planear até o detalhe e de impor escolhas que sempre implicam uma decisão a favor de uns e em detrimento de outros, decisão que, sendo os homens o que são, não deixaria de parecer arbitrária, levaria à omnipotência da burocracia que influiria na vida de cada um mais do que é admissível numa sociedade regida pela igualdade e pela justiça.

Na tão sedutora ideia de que a libertação das necessidades está ao alcance dos homens (o único obstáculo sendo, precisamente, a desigualdade económica ) e de que a sociedade se pode conduzir como um indivíduo racional, apenas precisando de acabar com a divisão dentro de si própria (a existência das classes) há muito mais do que aquilo que o marxismo viu nela.

Se é um erro, no fundo é o mesmo erro de Ptolomeu. A melhor explicação é aquela que parece estar de acordo com a experiência dos sentidos e com o sentimento da razão.

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