quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

O TEMPO DA LEITURA



"A vida parecia-lhes demasiado curta para se poder desperdiçar uma hora a ler romances, excepção feita àqueles de hoje porque, persuadidos de que havia sempre uma "chave" para a sua leitura, era para eles um regalo poder encontrar quem os "iniciasse", alguém que estivesse dentro do segredo."

"Esquisse du Côté de Guermantes" (Marcel Proust)


A leitura dum romance continua a ser vista por muitos como pouco produtiva, e o "roman à clef" já não está na moda (a não ser que já traga a chave, como no caso de alguns best sellers).

Sem lhes poder proporcionar o prazer de deter uma "chave", os romances não têm também a informação útil que eles consideram necessária.

O raciocínio parece ser o de que se aprende mais com um livro técnico ou científico do que com uma história, inventada do princípio ao fim. E o tempo é de facto por de mais curto para não irmos direitos ao essencial. Esta é a ideia que está por detrás dos resumos de uma publicação como a "Reader's Digest". O leitor desta revista poupa-se ao trabalho de ler as 1300 páginas de "Guerra e Paz" e fica a conhecer a intriga, que é uma espécie de chave, mas perde o que faz do romance uma obra original.

Na verdade, o romance nunca vai direito ao assunto, nem nos dá, a maior parte das vezes, qualquer informação "útil". Em vez de fórmulas, expõe-nos, desenvolvidamente ou não, o problema humano no tempo.

E com isso amplia o espírito e forma a inteligência que aprende a pensar a complexidade, em vez duma simples opinião, e o homem todo, em vez do que é preciso saber para se estar "a par do que se passa".

1 comentários:

Unknown disse...

Muito oportuna a lembrança e a comparação com a literatura científica. Eu também pensava que se aprendia mais com esta do que com aquela. Falando de Guerra e Paz e de Tolstói; nesta história temos uma visão panorâmica de toda uma vida, uma geração. É um pedaço dela, uma fatia generosa desse bolo, que nos é servido com a leitura. Abraços.