quinta-feira, 30 de abril de 2009


(José Ames)

O AMOR BIFRONTE


Proust com Alfred Agostinelli

"Todo o ser amado, e até numa certa medida todo o ser, é para nós como Janus, apresentando-nos a fronte que nos agrada, se esse ser nos abandona, a fronte sem brilho, se sabemos tê-lo à nossa disposição. No caso de Albertine, a sua companhia durável tinha qualquer coisa de penoso duma outra maneira que não posso dizer nesta narração. É terrível ter a vida duma outra pessoa presa à sua como uma bomba que se segurasse sem que pudéssemos largá-la sem crime. Mas que se tome como termo de comparação os altos e os baixos, os perigos, a inquietação, o receio de vir a acreditar mais tarde nas coisas falsas e verosímeis que não se poderão já explicar, sentimentos experimentados se se vive com um louco."

"La Prisonnière" (Marcel Proust)


Todo o amor é precário, mas os habitantes de Sodoma parecem conhecer uma espécie ainda mais efémera, e não podem esquecê-lo nas soluções de continuidade que a sociedade favorece.

Janus, o deus bifronte, o deus das portas, das entradas e saídas, representa bem o trânsito dos amantes.

Proust põe todo o romance entre parêntesis quando confessa que não pode dizer de que modo a companhia de Albertine podia ser penosa. Não me lembro que se explique mais à frente, pelo que talvez ele estivesse à sua maneira a mostrar-se piedoso perante a memória de alguém que muita amara, mas que já não pertencia ao mundo dos vivos.

Conhecemos todos a neurose de só se querer o que se não tem. Albertine é "presa por ter cão e presa por não o ter". E a referência que o narrador faz à loucura do outro, comparando-a à sua necessidade de mentir podia-se aplicar com mais propriedade ao ciúme despertado por esse sentimento que, segundo Deleuze, é "uma discussão sobre provas, um juízo de inocência proferido sobre um ser que no entanto se sabe ser culpado."

quarta-feira, 29 de abril de 2009


Lisboa (José Ames)

AMOR DE PERDIÇÃO

"Amor de Perdição" (2008-Mário Barroso)

Depois de um excepcional "O milagre segundo Salomé" (2004), Mário Barroso dá-nos uma magnífica versão livre do "Amor de Perdição".

O que há de Camilo aqui senão o nome das personagens e um romantismo desesperado que, milagre do cinema, não destoa num ambiente de telemóveis e discotecas na moderna Lisboa?

Ódios de família e amores fulminantes, como os dos Capuletos e Montéquios são um tema inesgotável e de sempre. A violência também. Barroso dá-nos um Simão Botelho (um físico e brilhante Tomás Alves) selvagem, pouco menos do que um rufião que brutaliza colegas e professores, mas que, no entanto, nos aparece envolto numa aura de incontível liberdade (a submissão é uma ignomínia, escreve ele nas paredes do quarto) e de fatalismo (um par absurdo, não é verdade?) que no-lo torna irresistivelmente simpático. Sem dúvida porque estamos dentro do segredo do seu triste destino. Tudo nos parece resgatado pela ideia do sacrifício total e do "amor de perdição".

Um outro tema que parece essencial na economia da história é a família de Simão, ela própria dividida e tragicamente incestuosa. O ódio entre os irmãos tem ressonâncias esquilianas. Os pais vivem de "couteaux tirés", observando não se sabe que contrato diabólico para manter as aparências. Em que medida é este foco deletério necessário à violência de Simão e à sua paixão por uma Albuquerque? Confere-lhe sem dúvida o carácter dum desafio mortal, marcado pelo absurdo e a impossibilidade.

A morte dos jovens nem sequer, como no trágico isabelino, traz a reconciliação das famílias desavindas. E Teresa, de facto, não está fora do pesadelo e é ignorada em si mesmo. Não é mais do que um míssil de longo alcance.

terça-feira, 28 de abril de 2009


(José Ames)

INCENSO E MANGAS DE QUIMONO


http://animo30.files.wordpress.com/2009/03/ameixoeira09.jpg


"Numa caixa de madeira de aloés, a Princesa colocara duas jarras de vidro com grossas bolas de incenso, envoltas em seda, a da jarra azul atada a um ramo de pinheiro de cinco pontas e a da jarra branca atada a um ramo de flores de ameixoeira, e os nós que as atavam eram maravilhosamente belos."

"O Romance do Genji" (Murasaki Shikibu)


A carta enviada pela Princesa Asegao ao Genji vem atada a um ramo de ameixoeira e acompanhada daquela caixa de madeira. Os sentimentos exprimem-se nesta delicadeza e nestes subterfúgios. Tudo é alusivo e vago, como se a precisão fosse uma estridência, um perigo a evitar.

Os sexos mal se distinguem pela sensibilidade nestes protocolos. O Príncipe Hotaru deixa-se comover pela doçura do estilo feminino: "pensou que as lágrimas que lhe arrancava aquele talento incomparável iam diluir a tinta no papel."

A contenção do desejo é a lei. É por isso que o traço da mão mais controlada é admirado na caligrafia.

E que fetichismo é este das mangas? "(...) contudo habituadas aos costumes do Palácio, as mangas e tudo o que era visível, muito ao gosto em voga, pareciam brilhar mais do que em qualquer outra parte, apesar de se tratar das mesmas combinações de cores e dos mesmos arranjos."

As mangas são uma metáfora das emoções mais profundas, elas recolhem as lágrimas do exílio e dos desgostos do amor.

Parece que esta corte não está só nos antípodas e a mais de mil anos de nós, mas que faz parte duma constelação mental fora de tudo o que é conhecido.

segunda-feira, 27 de abril de 2009


Braga (José Ames)

DESMATERIALIZAÇÃO


Einstein e Eddington


"O seu mundo consiste em 'acontecimentos', dos quais a 'matéria' deriva por construção lógica. Quem quer que leia, por exemplo, 'Space, Time and Gravitation' (Cambridge University Press, 1920), do Professor Eddington, verá que um materialismo antiquado não tem qualquer apoio na física moderna. Penso que o que tem valor permanente na visão dos behavioristas é o sentimento de que a física é a ciência mais fundamental que existe. Mas esta posição não pode ser chamada materialista, se, como parece ser o caso, a física não assume a existência da matéria."

"The Analysis of the Mind" (Bertrand Russell)


Tem sentido ainda alguém se proclamar materialista, quando a matéria é cada vez menos material?

Conhecemos a história do dualismo filosófico que opõe o espírito à matéria, de que Descartes é um expoente. Mas de certeza que nenhum físico moderno pensa em termos dualistas, porque se o sistema da ciência se opõe a alguma coisa é ao não-científico.

A ciência desenvolveu uma linguagem própria e justifica-se a si mesma graças a um sucesso prático revolucionário. E a filosofia não podia ficar imune à retroacção dos avanços científicos. Russell parece inclinar-se por uma espécie de neutralidade face à polémica dualista. Nem uma coisa nem outra ou as duas coisas ao mesmo tempo.

O materialismo fica assim confinado à esfera dum subsistema da política onde ainda podem ter curso as mais longínquas influências da filosofia crítica, da negação e da suspeita.

domingo, 26 de abril de 2009


(José Ames)

O REDUCIONISMO DO TEMPO


Gulliver em Liliput



"Por que é que não se pensa então, quando se muda a nossa vida porque não se sabe se uma mulher passou na rua de Bérri ou na rua Washington, por que é que não se pensa que esses poucos metros de diferença, e a mulher ela mesma, serão reduzidos ao centésimo milésimo (quer dizer a uma grandeza que não podemos perceber) se apenas tivermos a sabedoria de ficar alguns anos sem ver essa mulher, e aquilo que era ainda maior do que Gulliver se tornará numa liliputiana que nenhum microscópio - pelo menos do coração, porque o da memória indiferente é mais poderoso e menos frágil - poderá já perceber."

"La Prisonnière" (Marcel Proust)


A nossa sabedoria só dispõe da força necessária para reduzir o objecto do desejo às proporções de Liliput, quando esse objecto já nos é indiferente. Outro caso é mudarmos de caminho, porque as circunstâncias, essas sim, têm força. Mas mais "reducionista" ainda do que a abstinência do olhar é o tempo, a idade, que transforma o Gulliver amoroso numa cabeça de jívaro.

sábado, 25 de abril de 2009


Aveiro (José Ames)

O LUGAR PORTÁTIL


THE SYNAGOGUE OF KAIFENG
drawn by a French Jesuit priest, Jean Demenge, in 1722.



"O que mais se aproxima do primeiro extremo da dissolução - o eu sem lugar - é sem dúvida o judaísmo da diáspora dos últimos dois mil anos, do qual se pôde dizer, não sem razão, que foi um povo sem país - um estado de facto que Heinrich Heine resumiu dizendo que os judeus não estavam em casa num país, mas num livro, que lhes estava adstrito como 'pátria portátil'"

"Palácio de Cristal" (Peter Sloterdijk)


Do seu conceito de situações esféricas, Sloterdijk retira o outro extremo que é o dum lugar sem eu: "Tal vale para todos os espaços de trânsito, no sentido estrito e lato do termo (...)" A globalização participaria dos dois extremos.

Com uma ligação à internet, a "casa" pode estar em todo o lado. Se os contactos são virtuais, não o são mais do que aqueles que mantemos com o mundo dos mortos. As pessoas que se retiram para o seu passado, no fundo, poderiam estar em qualquer lugar, numa diáspora em regressão para o nada ou para a ressurreição.

Os lugares de trânsito, onde não se pode ter "casa", nem permanecer, são essenciais ao mundo globalizado que é o do lugar ubíquo.

Assim, o judaísmo apátrida foi o primeiro modelo do portátil que tende a ser a situação de todos.

Por ironia do destino, o país Israel parece estar hoje contra a corrente e, na sua obsessão pelo território físico, mostrar o zelo do neófito duma religião em declínio.

sexta-feira, 24 de abril de 2009


(José Ames)


O QUE NÃO SE PODE SIMULAR




"A ciência explorou o microcosmos e o macrocosmos; temos uma boa ideia da topografia da terra. A grande fronteira por explorar é a da complexidade. Os sistemas complexos incluem o corpo e os seus órgãos, especialmente o cérebro, a economia, a população e os sistemas evolutivos, o comportamento animal, as grandes moléculas - tudo coisas complicadas. Alguns destes sistemas são simuláveis em computadores e podem facilmente e com precisão ser modelizáveis; outros não podem ser simulados por nada mais simples do que o próprio sistema."

"The Dreams of Reason" (Heinz Pagels)


Este limite na nossa apreensão da complexidade, se admitirmos que simulação é igual a compreensão, quer dizer que estamos condenados a viver com o transcendente.

Não talvez naquele temor ligado ao sentimento do sublime (Kant) do homem que pela primeira vez atenta no espectáculo celeste ou que nunca tenha visto o oceano, mas numa incerteza sem sagrado e sem angústia motivada pelo que nunca poderemos conhecer.

Não podemos simular a economia real, por exemplo, podemos só construir modelos matemáticos que nos ajudem a seguir uma rota. Às vezes para a catástrofe.

quinta-feira, 23 de abril de 2009


Alcácer do Sal (José Ames)

DESESPERADA INJUSTIÇA


www.defencetalk.com


"Mas imagine-se que o bandido errante gosta do clima de um certo lugar e decide fixar-se, construindo um palácio e encorajando o seu exército a servir-se dos indígenas. Desesperadamente injusto que seja, os indígenas ficarão provavelmente melhor agora que o ditador decidiu ficar. Um ditador puramente movido pelo seu próprio interesse compreenderá que não pode destruir a economia e fazer o povo passar fome se planear continuar ali, porque então esgotaria os recursos e nada teria para roubar no ano seguinte."

"The Undercover Economist" (Tim Harford)


Este progresso do bandido que devasta um território de ano a ano com a sua horda para o ditador investido do poder que devora, ele e o seu séquito, metade do orçamento é, como diz Tim Harford, "desesperado".

Nada menos do que a justiça e a igualdade parece aceitável.

Mas essa "doença infantil" dos amigos da humanidade, no fundo, deseja ignorar as condições reais que agrilhoam o outro e substituí-las por uma liberdade fantástica.

E isto parece-se muito com a ideia de implantar a democracia, sem mais nem menos, no Iraque.

quarta-feira, 22 de abril de 2009


(José Ames)

DE DEUSES E MORTAIS


Susan Boyle


O que representa este fenómeno mediático da escocesa Susan Boyle cuja prestação no programa "Britain's Got Talent" e nas subsequentes entrevistas já foi vista na internet por milhões e milhões?

O triunfo do politicamente correcto e da má consciência duma sociedade que tornou nos seus deuses os manequins da moda, perante o logro de todos, crasso, ó mas quanto mais doce e perto das lágrimas a expiação do júri , exprimindo o entusiasmo e o alívio da audiência?

Ou significa o cansaço e a náusea da submissão colectiva a um ídolo que condena à abjecção e à insignificância os simples mortais, ainda por cima, velhos, feios e gordos?

E como mortais podem ainda ser insultados por iguais àqueles que propuseram a Susan um freak-porno em troca dum milhão de dólares. E pelos jornalistas que não encontraram outro comentário senão o da sua provável recusa... por ser uma mulher religiosa. Pelos vistos, fora da religião não há dignidade nem princípios.

terça-feira, 21 de abril de 2009


Alcochete (José Ames)

A EPÍTOME DO REAL


Landscape with the Fall of Icarus (Pieter Brueghel)


"O funeral, disse ele, tornou-se um acontecimento avulso com celebração da vida que não consegue 'transportar-nos para a fronteira da realidade alterada'. O foco nos ornamentos distrai-nos da realidade da morte, um reino que não podemos controlar, atenuar, predizer, ou em definitivo evitar. A morte é a epítome do terreno e do caótico mas também a epítome do real."

"Distracted" (Maggie Jackson)


Se fosse possível, desejaríamos que a realidade continuasse a mesma depois duma morte.

Receamos sobretudo a mudança em nós mesmos que é a grande oportunidade de sobrevivermos a alguém.

Faz-me lembrar aquele abutre de advogado de "O Futuro Radioso" (Atom Egoyan) que comprava a perda dum filho com o dinheiro a extorquir da companhia de seguros. Também ele trocava o real pelo virtual. E, como diz Maggie Jackson, nos nossos tempos, "o virtual torna-se a realidade preferida". E cita W.H. Auden:


(...) how everything turns away

Quite leisurely from the disaster; the ploughman may

Have heard the splash, the forsaken cry,

But for him it was not an important failure..."


No quadro de Brueghel, o camponês não levanta os olhos do seu sulco, enquanto Ícaro cai na paisagem.

segunda-feira, 20 de abril de 2009


(José Ames)

ENGENHARIA DO SUCESSO


Bernard Madoff


"Depois de 1998, quando uma colecção de 'nóbeis coroados' (e o 'crème de la crème' do 'establishment' económico-financeiro) ampliaram a Gestão do Capital a Longo Prazo (Long Term Capital Management), um fundo de derivativos (hedge fund), porque os métodos 'científicos' que usaram subestimavam o papel do acontecimento raro (rare event), tais metodologias e tais pretensões de compreensão dos riscos dos acontecimentos raros deveriam ter ficado desacreditadas. Em vez disso, o Fed (a Reserva Federal) apoiou as injecções de liquidez e a sua exposição aos acontecimentos raros (e ao erro do modelo) e duma forma evidente aumentou exponencialmente (como pudemos ver pelo inflacionamento de derivativos que não conseguimos compreender). Estaremos a utilizar modelos de incerteza para produzir certezas?"

"The fourth quadrant: a map of the limits of statistics" (Nassim Taleb in Edge)


O autor não incrimina as estatísticas, mas o uso que delas fazem os amadores apressados. Não tira que fiquemos com a ideia de que aquilo a que Taleb chama de acontecimento raro, pela sua natureza imprevisível, reduz tanto mais o alcance desta ciência quanto maior for a complexidade, o que inclui, evidentemente, o longo prazo.

Mas se tantos, desde os amadores aos magos da Reserva Federal, sucumbiram à sedução da falsa matemática (Bogus Math) e dos seus marketeers, transformando-se em aprendizes de feiticeiro, há aqui um sinal de que se perdeu algo mais do que prudência. Devemos perguntar-nos se aquele raciocínio que se baseia nos últimos 30 anos para modelizar os próximos 30 poderia ter inspirado tais decisões de longo prazo (mas para alguns sem risco e com imediata recompensa), não fora a perspectiva de se transferir a factura para terceiros.

Madoff, afinal, foi rei da finança por mais de 30 anos.

domingo, 19 de abril de 2009


Rochester (José Ames)

JOGOS DE VENTRÍLOQUO


curto-circuito


Telefonaram-me, à noite, um dia destes para me fazerem um questionário. Normalmente peço escusa, mas qualquer coisa no tom de voz do meu interlocutor espoletou em mim a reacção esperada. Havia uma segurança e uma casualidade nesse tom que me fez aguentar o inquérito até ao fim, apesar da monotonia das perguntas.

A minha relutância, decerto transpareceu, mas suponho que isso não influencia os resultados. O programa que interpretará os dados pode prever uma percentagem para as respostas atípicas, relutantes ou mesmo para a mentira deliberada, tal como o negócio dos supermercados conta com o pequeno furto que escapa à câmara de vigilância, por estar num ângulo morto, por exemplo.

Qualquer que seja, de resto, o valor da estatística, ela permitirá sempre uma decisão táctica fundamentada (nem que seja numa ficção). E o que seria o marketing sem as sondagens?

E o que é interessante é que pela interacção entre o mercado e o estudo de opinião, uma ficção acabará quase sempre por impor-se. Dir-me-ão que a sanção dum cálculo mal feito é sempre um fracasso. E eu digo que também o “dumping” é no imediato um fracasso, mas uma vitória na estratégia.



sábado, 18 de abril de 2009


(José Ames)

POWERPOINTERS


Maggie Jackson


"Mas opositores encabeçados pelo teórico da informação Edward Tufte, são corrosivos na sua crítica. Dizem que o software modela os pensamentos e os dados em formatos sedutoramente profissionais embora estreitos e simplistas, promovendo apresentações desinformativas e muitas vezes enganosas que desencorajam a criatividade ou a argumentação. Em parte como resultado do trabalho de Tufte, a NASA culpou a sua confiança no Power-Point por uma rotina de ofuscação e comunicação errada que ajudou a condenar a nave Challenger. 'Quando a apresentação se torna a poderosa ideia de si própria, diminui a nossa apreciação da complexidade', conclui a professora do MIT, Sherry Turkle , depois de estudar o uso do Power-Point nas aulas."

"Distracted" (Maggie Jackson)


Estamos ainda, entre nós, na fase da ofuscação e dos padrões deceptivos.

Nos departamentos de formação das empresas, o Power-Point é rei e os governantes que se consideram modernos confiam na desarmante simplicidade das apresentações.

Isso acontece tanto mais naturalmente quanto nas escolas e nas universidades a tecnologia foi adoptada sem as precauções devidas, tornando-se ela, como dizia Mc Luhan, a própria mensagem. O que se aprende num jogo de computador é a jogar.

"Há muito foi provado que muitos jogos de computador ensinam a espécie de perícia icónica e espacial útil para jogar mais jogos de computador, e pouco mais." (ibidem)

À medida que a linguagem se afasta da palavra e do texto escrito, tornamo-nos mais superficiais porque é a esse nível que a nossa atenção é solicitada pela todo-poderosa tecnologia.

E o que é mais grave, podemos estar, como diz a autora, a perder as aptidões necessárias para sobreviver num mundo cada vez mais complexo.

sexta-feira, 17 de abril de 2009


Génova (José Ames)

CONTROLO E COMPREENSÃO


Sir John Maddox e Peter Atkins


"A complexidade do problema é tão grande que não podemos compreendê-lo na linguagem que venho usando; não pode ser compreendido na linguagem dos manuais, porque se tornou um problema matemático."

"(...) Como é que estas influências em competição conspiram para decidir que a célula se vai agora dividir em duas. Do que precisamos é de modelos matemáticos para dizer o que realmente se passa."

"Complexity and Catastroph, a talk with Sir John Maddox" (in Edge)


Mas que tipo de compreensão é este, quando a complexidade dum processo só pode ser explicada pela simulação do próprio processo?

Talvez a matemática nos dê algum controlo sobre o que se passa, por exemplo, no ciclo da célula, mas isso já ultrapassa de tal forma o nosso sensorium, a nossa capacidade de ver o que se passa que mal podemos chamar-lhe compreensão.

Ou, talvez, nos aproximemos daquilo que Pessoa dizia da sabedoria: "Não querer compreender, não analisar... ver-se como à natureza; olhar para as suas impressões como para um campo - a sabedoria é isto." (O Livro do Desassossego)

O modelo matemático permite-nos "ver" a natureza como nos vemos a nós mesmos, sem analisar (pode-se dizer isto porque a psicanálise já transitou em julgado).

quinta-feira, 16 de abril de 2009


(José Ames)

OS LÁBIOS CONDENAM-TE


http://www.ad.or.at/bilder/justitia-mf.jpg


"Pense só no efeito que pode ter a superstição. Você falou com um deles, não? Ele mal foi capaz de lhe dar uma resposta. Há muita coisa que o pode tornar a si confuso, naturalmente, mas uma delas, para ele, foi a aparência dos seus lábios. Disse-nos depois que pensou ver qualquer coisa nos seus lábios que queriam dizer: ele mesmo se vai condenar."

"O Processo" (Franz Kafka)


Pode-se significar melhor a predestinação (temática do judaísmo por excelência) e a impotência do indivíduo que está perante um sistema que a complicação das leis e dos procedimentos tornou transcendente?

Depois, há a vida, sempre inclassificável e, no fundo, incompreensível, contra a Verdade fortificada da Lei.

Atribuir um significado à forma dos lábios só poderia ter alguma pertinência "psicológica", mas todas as diligências de K. para se libertar do seu processo não vêm igualmente ao caso.

quarta-feira, 15 de abril de 2009


Estremoz (José Ames)

A CULTURA "COORDENADA"


Thomas Mann (1875/1955)


"A reordenação da vida cultural alemã de acordo com a linha nazi teve na verdade um grande alcance. Mas o mais impressionante aspecto da 'coordenação' da cultura foi a alacridade e a ânsia com que intelectuais, escritores, actores e publicistas activamente colaboraram em acções que não só empobreceram e sujeitaram a uma camisa de forças a cultura germânica para os doze anos seguintes, mas baniram também e puseram fora da lei alguns dos seus mais brilhantes expoentes (...)"

"Hubris" (Ian Kershaw)


Depois da ascensão de Hitler ao poder, "deixou de haver vida social; nem sequer se podia ter um clube de bowling que não fosse 'coordenado'".

A coordenação (Gleichschaltung), que era de facto a nazificação, estendeu-se a todas as aldeias e lugares.

O peso duma tal organização só tinha equivalente no mundo militar. O povo devia rever-se no Führer e abdicar da vontade própria. Era esse o preço da unidade e dos "amanhãs que cantam".

O oportunismo e o mais genuíno idealismo, como diz Kershner, andavam misturados.

Até um homem como Thomas Mann, "admitiu inicialmente algumas incertezas quanto ao novo regime e deu a entender que aprovava a legislação anti-semita de Abril de 1933".

Se os melhores se podem enganar assim, como esperar mais da intelligentsia em geral? A vontade de se auto-iludir responde pela "alacridade" com que se comprometeu.

terça-feira, 14 de abril de 2009


(José Ames)

A REVOLUÇÃO DOS MANAGERS



"A revolução directorial não é algo que os nossos filhos devam esperar; podemos já vê-la diante dos nossos olhos. Da mesma maneira que só damos pelo nosso envelhecimento quando já somos velhos, também os contemporâneos duma grande mudança social só raramente se apercebem de que a sociedade está a mudar antes da mudança se ter já efectuado. As velhas palavras e as velhas convicções subsistem muito tempo depois da realidade social que as animava ter deixado de existir. A nossa sabedoria em relação às questões sociais não é mais, quase sempre, do que retrospectiva. Esta constatação deveria ser humilhante para os homens; se a justiça está para lá do nosso alcance, gostaríamos pelo menos de poder pretender ao conhecimento."

"L'ère des organisateurs" (James Burnham)


O grupo dos "directores" (os managers) ficou muito exposto na presente crise. Sem possuírem os "meios de produção", viu-se que a economia depende da sua visão do mundo e das suas decisões e que isso lhes garante um "direito preferencial na distribuição dos produtos".

Viu-se que, sem formarem uma classe típica, têm todas as características duma divisão essencial em relação à restante sociedade. "Não mais do que ainda há pouco o fizeram os capitalistas, os "directores" não se reuniram para decidir explicita e deliberadamente que iam reclamar o poder mundial", nem "tampouco foram os "directores" que construíram e propagaram as suas ideologias: essa tarefa foi e é cumprida por intelectuais, escritores e filósofos".

A "maximização dos lucros" deu lugar à maximização dos bónus e, nesta nova situação, a propriedade só vinha estorvar.

O capitalismo engendrou, assim, uma espécie de nomenklatura que, contudo, em vez de factor de estabilização parece viver das crises do sistema.

segunda-feira, 13 de abril de 2009


Porto (José Ames)

O NACIONALISMO


Tomas Masaryk (1850/1937)


"Pois a teoria política do nacionalismo assenta no princípio de que há grupos étnicos que, simultaneamente, são grupos linguísticos e que, por acaso, também habitam regiões geograficamente unificadas e coesas com fronteiras naturais, passíveis de serem defendidas de um ponto de vista militar - grupos que se encontram unidos por uma língua comum, um território comum, uma história comum, uma cultura comum e um destino comum. Eis a teoria que esteve subjacente ao princípio de Masaryk-Wilson da 'Autodeterminação das Nações'; foi em nome dela que o Estado multilingue da Áustria foi destruído."

"Epistemologia e Industrialização" (Karl Popper)


Masaryk não era o único a considerar a Áustria-Hungria como um estado anti-racional, que deveria ser desmembrado.

A Cacânia de Robert Musil é esse estado e o seu grande romance é iluminado pela inteligência do absurdo e da decadência. Para não falar em Kafka, que também escreveu em alemão. A Mitteleurope parecia condenada por todos os espíritos formados no hegelianismo tornado senso comum.

Se o nacionalismo é uma construção teórica "perniciosa, como também impossível de realizar", não há dúvida que se impunha aos seus defensores como a marcha da própria Razão, e é sintomático que apenas tenha sido combatido pelos maus motivos.

Colhemos ainda hoje os frutos dessa maléfica utopia, perante a qual a razão fica desarmada. É por isso também que todos os esboços de organização supranacional são vistos, geralmente, como uma perda de identidade.

domingo, 12 de abril de 2009


(José Ames)

OS CLONES DE MENGELE




"Hitler queria ouvi falar da América, onde Lüdecke tinha passado uns poucos anos antes numa variedade de empregos insignificantes e de negócios de curta duração. Ficou contente por descobrir o interesse de Lüdecke pelas histórias de cowboys e índios de Karl May que tinha devorado quando era rapaz. Disse que era capaz ainda de as ler e de se emocionar com isso."

"Hubris" (Ian Kershaw)


Num filme de Franklin Schaffner de 1978 ("The boys from Brazil"), o célebre Joseph Mengele (O Anjo da Morte) tinha posto em prática um plano para plantar algumas dezenas de clones de Hitler em diversos países, cujos pais adoptivos deveriam morrer precisamente com a mesma idade dos progenitores do Führer. Os rapazes eram exactamente iguais, com olhos azuis, cabelo liso e uma forte tendência autoritária, mas nenhum podia corresponder à ideia maníaca de Mengele. A ideia de que um homem é alguma coisa fora das suas raízes e do seu contexto histórico aflora às vezes em certas expressões de impotente saudosismo.

Hitler admirava ainda mais Karl May por descrever lugares onde nunca tinha estado , pois isso significava aos seus olhos um grande poder de imaginação. Recomendava esses romances aos seus generais e chegou a mandá-los distribuir pelos soldados da frente.

Este culto, partilhado por tantos bons alemães, permite-nos pensar que o mesmo homem teria sido inofensivo noutro tempo ou noutro lugar como os clones do filme de Schaffner.

sábado, 11 de abril de 2009


Lisboa (José Ames)

GANÂNCIA OU ESTUPIDEZ?


Pieter Brueghel, The Parable of the Blind (1568)


"Existem dualismos por toda a parte: espírito ou matéria, literatura ou pornografia, investimento ou especulação. Ainda hoje no New York Times, David Brooks se perguntava se a nossa presente crise era devida à ganância ou à estupidez e sentiu-se obrigado a optar pela estupidez."

Emanuel Derman (in Edge)


O dualismo, como diz o articulista, é um sinal de complexidade, "uma tentativa de forçar a dualidade na unidade" e cita o exemplo dos físicos que aprenderam a converter o dilema onda ou partícula numa questão de onda e partícula e "vivem com isso, ou pelo menos deixaram de pensar nisso enquanto puderem continuar a ter sucesso nos seus cálculos."

No caso da crise que nos caiu em cima, a ganância é o que melhor corresponde à indignação generalizada pelas proporções da catástrofe. E naqueles que cegamente confiaram nas virtudes do sistema para se regular a si mesmo, como se as forças positivas e as forças negativas encontrassem automaticamente um ponto de equilíbrio, o sentimento de terem sido traídos e do desabar dum mito que entre os americanos era quase patriótico.

Mas se os cálculos dos mais espertos e dos mais doutrinados falharam tão clamorosamente, apesar dos numerosos sinais de alerta, é de facto a estupidez, ou a parábola dos cegos tal como Brueghel no-la representou que se impõe.

A velocidade das redes de computadores e a infinita massa de informação disponível tomaram-se precipitadamente como sinónimos de controlo e de supervisão, levando alguns, pateticamente, a confundir a realidade com as suas simulações cada vez mais inteligentes.

Ora, a estupidez pode conviver com a maior inteligência relativa, e um facto parece impor-se com a revolução do computador, é que a tecnologia, sendo parte da complexidade do mundo, não nos torna mais clarividentes.

Podemos ter atingido o ponto de estarmos perante o mundo que ajudamos a criar tão sujeitos à superstição quanto a humanidade primitiva.

Para nos vermos tal como somos é melhor contemplar a nossa irremediável impotência do que deitar contas ao caminho andado. Todos os progressos são mais do que compensados pelo aumento da complexidade.

sexta-feira, 10 de abril de 2009


(José Ames)

A EDUCAÇÃO PLATÓNICA


Plato in his academy, painting by Swedish painter Carl Johan Wahibom woodcut for the magazine by an unknown xylographer.


"...Se tudo isso é exacto, eis o que nos é preciso pensar. A educação não é efectivamente o que alguns afirmam. Eles dizem que, não se encontrando a ciência na alma, é preciso que se lha dê, como se dá a visão a olhos cegos.

- Sim, eles dizem isso.

- Ora, a nossa teoria significa que existe na alma de cada um a faculdade e o órgão da inteligência, mas como um olho impossível de voltar das trevas para os lugares iluminados sem voltar ao mesmo tempo o corpo todo."

"A República - Livro VI" (Platão, da tradução de Simone Weil)


Devemos compreender esta passagem como se Platão quisesse dizer que a ciência não se pode adquirir sem envolvermos todo o nosso ser? Que não é ciência um conhecimento que não nos modifica profundamente ( e não apenas a nossa perspectiva)?

Sabemos que o filósofo apenas reconhece no Bem a fonte da luz (o verdadeiro conhecimento), e isso parece-nos saborosamente anacrónico, tanto a ciência moderna se desenvolveu abstraída de qualquer preocupação ética. Mais, num espírito cioso da independência da ciência, não só em relação à ética, mas também à religião e aos próprios valores, poder-se-ia até sustentar que essa é uma das condições do seu progresso.

Na teoria defendida por Karl Popper a partir dos problemas que colocam sempre novos problemas num processo imparável de aproximação à verdade, teríamos uma espécie de reacção em cadeia dentro dum único sistema, com a sua semântica exclusiva.

A ideia da educação platónica nada tem a ver com esta ciência separada e independente. É uma arte de conversão e não de aquisição. Trata-se de corrigir a visão espontânea, não através duma prótese, mas duma mudança de direcção do olhar e do "corpo todo". A alegoria da caverna fornece-nos a física da situação.

Quando vemos que a tecnologia instantaneamente coloca à nossa disposição todo o conhecimento objectivo com que poderíamos sonhar, a questão de adquirir torna-se irrelevante, ao passo que a da direcção do nosso olhar, as nossas escolhas e decisões passam a ser o que realmente importa.

quinta-feira, 9 de abril de 2009


Lisboa (José Ames)

AS LIÇÕES DA HISTÓRIA


O carro da História


"Alude-se a regentes, a homens de estado, a povos, sobretudo para a instrução mediante a experiência da história. Mas o que a experiência e a história ensinam é que os povos e governos jamais aprenderam algo da história e actuaram segundo doutrinas que dela se tivessem extraído."

"Introdução à Filosofia da História" (Hegel)


Mas será assim que os exemplos provam a sua eficácia? Está, evidentemente, fora de causa a repetição dos casos (a não ser no sentido da blague marxista), mas o fenómeno da inspiração é demasiado complexo para se reconhecer no perfil duma "lição" aprendida. Porque, não é verdade, a lição pressupunha que algo de geral e repetível podia ser transmitido. Não é o caso com as histórias, quer elas sejam edificantes quer motivadas pelo espírito crítico. O aspecto mais relevante duma situação real é a sua absoluta novidade, perante a qual todas as lições do passado, no melhor, só podem servir para criar o espírito aberto a todas as escolhas possíveis (confirmando embora uma tradição).

quarta-feira, 8 de abril de 2009


(José Ames)

A INTELIGÊNCIA DIABÓLICA


Fausto assina o pacto de Mefistófeles


"Se a sua consciência era tão perigosa, é que ele a sentia não como uma claridade, mas como algo de obscuro - era para ele um elemento tão cego quanto o instinto, não tinha nela confiança, sentia-se seu prisioneiro, mas não sabia onde o poderia conduzir. E era mau psicólogo, por excesso de inteligência e de imaginação - na sua visão dilatada do homem havia lugar para tudo."

"La Pornographie" (Witold Gombrowicz)


Fréderic, esse Mefistófeles em estado de sonambulismo, tinha medo do sonho que sonhava. E a consciência para que lhe servia? Os seus "actos" instintivos obrigariam um outro a parar se acordasse na obscuridade. Por isso ele não queria acordar e a inteligência parece estar aqui a mais.

O diabo é manifestamente inteligente e imaginativo. Em que medida poderia ser um mau psicólogo?

Um desses achados que se encontram só na literatura é este. A inteligência diabólica é estratégica e servil (visa perder o seu homem), fornecendo-lhe a imaginação o espectro inesgotável das tácticas. Mas por isso mesmo nunca compreenderá a sua vítima.

terça-feira, 7 de abril de 2009


Amarante (José Ames)

A MULHER SEM CABEÇA


"A mulher sem cabeça"(2008-Lucrecia Martel)


Verónica (Maria Onetto), no regresso dum convívio, tenta alcançar o telemóvel e atropela um cão. O susto obriga-a a parar para se recompor. Mais tarde no hospital tira uma radiografia à cabeça. O seu comportamento social fica muito afectado. Torna-se ausente e esquecida de tudo. Parece-lhe, cada vez mais, de que em vez dum cão, matou uma pessoa. Pouco a pouco, retoma a sua vida normal, mas no fundo já não é a mesma. Continua a procurar uma revelação do que se passou realmente no acidente. O seu encontro com a morte não foi inteiramente falhado. A sua obsessão é a recusa em aceitar que o que se passou não teve importância, visto que foi só um cão que foi atropelado.

Há casos em que as pessoas deixam de poder pegar outra vez num automóvel, têm medo de conduzir e de convocar de novo o destino. Em Verónica, isso não mudou. Simplesmente está já entre dois mundos.

segunda-feira, 6 de abril de 2009


(José Ames)

A PRÉ-HISTÓRIA DE MOZART


O piano de Mozart


"É lícito interrogarmo-nos sobre os estímulos musicais que o futuro Mozart ouvia... antes de nascer. Queiramos reflectir devidamente sobre o conteúdo 'sonoro' do apartamento relativamente exíguo habitado pelos Mozart em Salzburgo: Nannerl exercita-se várias horas por dia no cravo, ou então é Leopold que ensaia as obras inscritas no próximo concerto da corte, ou vêm amigos para preparar um quarteto. Esse lugar estava permanentemente habitado pelos sons musicais. A Senhora Mozart mãe ia e vinha, passeando o futuro Wolfgang nessa infusão de música."

"O cérebro de Mozart" (Bernard Lechevalier)


Era tudo tão propício à música no ambiente dos Mozart e na própria cidade dos príncipes bispos que quase apetece prescindir, sendo ele para mais tão difícil de estabelecer, do contributo duma "hereditariedade stricto sensu nos dotes extraordinários de Wolfgang Amadeus (...)"

A organização do seu cérebro (mas deveríamos, sem dúvida falar do seu corpo) terá por isso começado muito antes de ter nascido e de ter recebido as primeiras lições da família.

Mas isto nada nos diz sobre o que tornou possível que este feto em particular, não apenas ouvisse os sons exteriores, como acontecerá com todos os outros, mas estruturasse o seu cérebro em função da música.

O caso de Mozart abre assim o espaço para uma narração menos decidível ainda do que a da psicanálise.