sábado, 18 de junho de 2005

DOS GRAFFITI AO ARRASTÃO


A liberdade de descriação



A violência é como o jogo de espelhos de Arquimedes que incendiou a frota.
O medo na praia de Carcavelos desfigurou os factos em espíritos preparados para esperar o pior.

Porque o espectáculo da televisão anestesia, torna-nos indiferentes à violência. Mas a experiência real já não encontra a inocência nem a incredulidade.

Tudo estava já escrito pela TV e pelos graffiti nas paredes.

quinta-feira, 16 de junho de 2005

SÍMBOLO E PARADOXO





O funeral de Álvaro Cunhal revelou que um homem pode sempre salvar um erro, mesmo monumental, desde que firmemente creia em si.

Todas as virtudes da vontade persistente e da fidelidade às ideias acabam por pesar mais do que a disponibilidade para aceitar a verdade dos outros e aquilo que hoje se chama de abrangência de ideias.

Os milhares que seguiram a urna até ao Alto de S. João ou que viram o imenso cortejo pela televisão não pensaram que a vida deste homem devia ser julgada pela queda do Muro de Berlim ou pelo fracasso da URSS, ou sequer pelos desaires eleitorais do partido a que dedicou a sua vida. Dir-se-ia que se tivessem sido sucessos em vez de fracassos, não poderíamos assistir a tão pujante e comovente cerimónia. Porque ali se projectava, na sua força alucinante, a verdade da fé, sobre um fundo movediço de sombras que é o do relativismo e do pragmatismo dos novos tempos, e toda a problemática do politicamente correcto.

Tudo isto transcende a política e é maior do que a vida, maior do que o próprio Álvaro Cunhal. E com ele morto, a sua lenda pode subir aos céus. E é a sua heróica resistência à ditadura que agora sobressai, em detrimento do segundo período da sua vida, o da luta pelo poder e do fracasso, fazendo que o homem que, segundo muitos, mais chegou a ameaçar a liberdade se tenha tornado num perene símbolo dela.

quarta-feira, 1 de junho de 2005

A INVASÃO DOS WALL-SNATCHERS


A verdade pichada



Hoje a conquista de Ceuta pelo 78 foi fácil ( ao contrário dos últimos dias, em que houve pandemónio). Mais adiante, as pirâmides de terra do Museu e, por todo o lado, além do pó, a babugem dos graffiti, que pelos vistos, apoquenta mais os velhos do que os novos.

E talvez haja por detrás desse sentimento algo mais do que um preconceito estético ou uma saudade. A mensagem dessas garatujas é a da desordem e a da insegurança. É tudo desleixo, ninguém liga. Razão para os mais frágeis se sentirem.

Mas esta vulnerabilidade de todas as paredes da cidade, à compulsão maníaca da pichagem, envolve-nos a todos nesse outro fenómeno social dos nossos tempos: a precariedade.

É o fim dos empregos para toda a vida e é o princípio do fim dos monumentos.

A solução está talvez na cópia pessoal.
Qualquer dia, a cada um restará ter a sua Amazónia virtual e a sua cidade de antes da invasão dos “wall-snatchers”.