segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

O ALIMENTO E O PITÉU


Johann Sebastian Bach (1685/1750)


"O verdadeiro músico, segundo creio, é antes um homem que se alimenta do que um homem que saboreia. E esta diferença é patente nas obras: porque entre aqueles que compõem, há também apreciadores, que saboreiam, se posso assim dizer, o seu próprio molho, e até, por precaução, o dão a provar a outros amadores, acrescentando assim pimenta, sal e noz moscada; e parece-me que reconheço logo a música que foi feita assim."

"Propos de Littérature" (Alain)


É ainda a diferença entre a obra que resulta da expressão do artista sobre si próprio ( e tanto a mais celebrada arte como o mais puro vandalismo urbano podem ter tal motivação) e a obra que é feita, o melhor que se pode e se sabe, mais segundo a sua própria lei do que segundo o sentimento de quem a faz.

Seria isso que, como diz Karl Popper, distinguiria Bach de tantos outros músicos.

É à perfeita humildade do compositor, que escrevia "para maior glória de Deus", e não para cumprir uma qualquer necessidade de expressão, que devemos essa música sem vaidade, nem salamaleques, como se a ética fosse também uma regra estética.

E, fazendo jus ao ditado de que ninguém é profeta na sua terra, o próprio filho, Carl Philipp Emanuel, o considerava um velho picuinhas (der alte Zopf) ultrapassado.

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