segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

O CONDE



Ao passar por uma travessa com o nome dum conde, vieram-me à memória os tempos em que conheci um rapaz bonacheirão que se dizia de sangue azul, mas mais como quem nos revela uma curiosidade física sobre si próprio do que outra coisa.

Eram os anos da recruta, arrancados ao ramerrão do emprego, atrás duma secretária, em que nos sentimos mortalmente responsáveis pelo que fazemos e estamos bem cientes de ter de pagar pelos nossos erros.

Ali não. Tomavam conta do nosso destino e davam-nos um papel, o mais afastado possível da profissão. É por isso que a recruta se parecia tanto com umas férias grandes, em que em vez de flanar e de fazer o que nos apetece, tivéssemos uma tarefa árdua pela frente, como o de escalar uma montanha, não para ver a vista, mas para a obediência nos entrar no corpo.

Na altura, não me punha, verdadeiramente, a questão da finalidade de tudo aquilo. Quando voltamos a pensar nisso, muito tempo depois, encontramos muitas semelhanças com qualquer situação humana enredada nas "malhas que o império tece".

Mas aos vinte anos, aquele congresso de iguais, vindos de todos os cantos do país, que a coerção transformava numa fraternidade de destino, com todos os interesses próprios suspensos, as relações familiares e sociais suspensas, era quase inteiramente que estávamos disponíveis para a amizade. Até as ideias, assim partilhadas, depois dos exercícios, tinham algo da simplicidade homérica.

Nunca mais voltou a ser assim.

0 comentários: