sexta-feira, 22 de junho de 2012

DE MANHÃ TEMENDO...


"Apesar dos seus receios, ele não a achou feia por nada deste mundo."

"O Homem Sem Qualidades" (Robert Musil)




Assim começa também o "Barco Negro" de David Mourão-Ferreira: "De manhã temendo que me achasses feia (...)"

Alí, é um pensamento de Clarisse que, tal como uma pitonisa, está aberta às correntes de ar do invisível. Nesse estado, o amor de Walter não tem nenhum privilégio. Mas ao regressar à terra, ou ao "acordar deitada na areia" que, no poeta, poderia fazer pensar na 'tristeza post coitum', há um momento de insegurança.

Porque se há um regresso, se há um reencontro, não importa a duração. Pode-se voltar duma viagem à Lua, de uma "comissão no Ultramar" ou da experiência do Nirvana, o tempo é um intruso, o tempo faz outro triângulo amoroso, que torna tudo instável.

Por que é que Clarisse quer conservar a "graça" se apenas seguiu o seu destino? Porque sempre haveremos de desejar o inconciliável. Mas Walter está apaixonado.

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