quinta-feira, 22 de maio de 2014

O PROGRESSO

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"O estudo da 'mão fria' mostrou que não podemos confiar plenamente em que as nossas preferências reflitam os nossos interesses, ainda que sejam baseadas na experiência pessoal e ainda que a recordação dessa experiência tenha sido obtida no último quarto de hora! Os gostos e as decisões são moldados pelas recordações e as recordações podem ser erradas. A evidência apresenta um profundo desafio à ideia de que os seres humanos têm preferências consistentes e que sabem como maximizá-las, uma pedra angular do modelo do agente racional."


(Daniel Kahneman)


Preferimos manter a mão no gelo, desde que a temperatura vá aumentando, mesmo ligeiramente, a tirá-la de uma vez. Quer dizer, prestamos mais atenção ao pico da dor e ao fim dela, do que à sua duração ('peak-end rule').

Kahneman conclui que somos maus avaliadores do nosso próprio interesse, e lá se vai a 'teoria dos jogos' que confia nas escolhas racionais do indivíduo.

Mas se partirmos do princípio contrário, de que essas escolhas pouco têm a ver com a razão (para não dizer que são irracionais, o que seria um manifesto exagero), então justifica-se a regra da menoridade política dos 'cidadãos'. Já o primeiro dos filósofos considerava necessário contar histórias ao povo, em vez de se pretender que compreendesse a verdade.

Essa tradição, de facto, é muito antiga, e o próprio Evangelho recorre de preferência ao discurso por parábolas. A teoria da vanguarda política é um exemplo muito mais próximo. É a eternização da célebre desculpa de Salazar: o povo não está ainda preparado para a democracia.

Mas, afinal, a democracia é uma regra e não uma teoria da verdade. O importante é que o jogo seja aceite por todos (ou pela maioria) e que dele faça parte a possibilidade de destituir o governo, sem derramamento de sangue (como dizia Popper). Quem espera que a 'vontade popular' seja directamente expressa nas decisões da elite política não vive neste mundo.

O Grande Animal (expressão platónica) não tem condições para governar e, como colectivo, só pode 'agir' passionalmente.

A psicologia e as 'ciências humanas' estão, por isso, na linha da frente da desmitologização do indivíduo criado por um mais do que duas vezes centenário Iluminismo. A economia é o território mais 'Iluminado ' desse combate.

A questão que se coloca é, então, o que é que podemos considerar um progresso em relação ao individualismo das Luzes?

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