terça-feira, 15 de abril de 2014

PERDER O NOSSO LATIM

 

Não sei se alguém já estudou o quanto o latim deixou de crescer, desde que o império romano desapareceu, levando consigo as instituições que faziam essa língua, o latim 'vulgar' e o dos literatos, ser uma língua falada e praticada dentro de um certo espírito e de uma certa disciplina.

Bem sei que durante toda a Idade Média, o latim foi cultivado por uma minoria letrada e que foi assim quase até ao fim do século XVIII. Além disso, foi desde o estabelecimento da Igreja Católica, e ainda é nos nossos dias, a sua língua oficial.

Mas uma língua morta parou no tempo, apesar do culto comemorativo, cada vez mais restringido à excentridade de uns poucos. Fourier, no seu falanstério, teria, sem dúvida, um jardim para os latinistas.

Ora, não é preciso mais do que uma consulta a um bom dicionário para nos darmos conta da riqueza e da complexidade dessa língua, que está na origem das que, hoje, grande parte dos europeus e nações de outros continentes falam. Esse legado da civilização romana podemos valorizá-lo, junto das novas gerações, quanto mais não seja para melhor se compreenderem as línguas modernas, ou podemos enterrá-lo, com aberrações como o acordo ortográfico.

Não poderemos ressuscitar o latim e o grego, nem imaginar a que alturas teriam chegado um e outro se ainda fossem línguas vivas. Mas com mais algumas pazadas deixaremos que o que fomos, o passado que é parte de nós, desapareça da nossa vista.

Ao contrário de algumas pedras amontoadas, de algumas colunas por terra ou sustentadas por ganchos, que só o prestígio antigo embeleza, e que alimentam o turista de ontem e de hoje, o dicionário do latim parece completo em si mesmo, exuberante, mesmo na sua imobilidade, como uma fonte suspensa. Só lhe falta um povo.

Albert Camus, citando Spengler, diz: "A coluna egípcia era no princípio uma coluna de pedra, a coluna dórica era uma coluna em madeira. A alma ática exprimia assim a sua profunda hostilidade em relação ao tempo ('la durée')". A cultura egípcia, a preocupação ('souci') incarnada." Os Gregos, povo feliz, não têm história."

Nós não nos julgamos felizes...ou será a não consciência de que o poderemos ser uma condição da felicidade?

 

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