"Depois de o ter visto perecer num suplício infame, ela sustém sobre os seus joelhos a sua cabeça inanimada. Eis, sem dúvida, a maior dor que pode sentir o coração de uma mãe.
Mas a religião vem anular num abrir e fechar de olhos o que poderia existir de enternecedor nesta história se ela se passasse no fundo duma cabana. Se Maria crê que o seu filho é Deus (e ela não pode ter dúvidas sobre isso), crê também que ele é Todo-Poderoso. A partir daí, o leitor só tem que mergulhar na sua alma; e se for susceptível de algum sentimento verdadeiro, verá que Maria já não pode amar Jesus com o amor de mãe, com esse amor tão íntimo que se compõe de recordações duma antiga protecção e da esperança num esteio futuro."
"Promenades dans Rome" (Stendhal)
Estas são as reflexões que ocupam Stendhal diante da "Pietà" de Miguel Ângelo, na igreja de S. Pedro, em Roma.
Ele não consegue encontrar a verdade humana dessa escultura sublime, que desafia, de facto, a psicologia (porque é a dor duma mãe que não sabe o que se passa, ou não pode encontrar consolo na glória futura) e as leis da natureza (a mãe tem a idade do filho).
Mas dir-se-ia que nada disso prejudica a universal admiração.
Haverá outras Pietàs mais realistas e mais próximas até do espírito religioso.
Mas a verdade é que a perfeição dispensa todas as justificações, embora Miguel Ângelo não tenha aqui atingido ainda a grandeza da sua terribilità.
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