quinta-feira, 27 de março de 2014

O ESTADO TOTAL

António de Oliveira Salazar

 

"é preciso afastar de nós o impulso tendente à formação do que poderia chamar-se o Estado totalitário", um "Estado essencialmente pagão", e portanto "incompatível por natureza com o génio da nossa civilização cristã."

(Salazar no I Congresso da União Nacional, 26 de Maio de 1934, in "História de Portugal" coordenada por Rui Ramos)


Carl Schmitt, um jurista alemão, havia cunhado o termo 'totalstaat' em 1920, advogando um tipo de estado que assumisse todas as funções da sociedade (conheci e conheço pessoas que acreditam que a politicização total do pensamento é o futuro da humanidade).

Salazar, que na altura deste discurso enfrentava a vaga do 'nacional-sindicalismo' de Rolão Preto, êmulo do fascismo italiano e germânico e que contestava a política do Estado Novo (seria detido dois meses depois do discurso do ditador), demarca-se do que ele chama Estado totalitário por causa do seu carácter 'essencialmente pagão'.

Segundo Ramos, o salazarismo não era o monólito que aparentava. Era o resultado de um 'equilibrismo' político entre as grandes tendências do antigo republicanismo, em que Salazar foi exímio. Tinha tudo menos de 'revolucionário' (ao contrário do fascismo ideológico europeu). A obsessão do ditador era o regresso aos bons e velhos hábitos que nunca existiram por muito tempo no Portugal contemporâneo.

De qualquer modo, o termo pagão aplicado ao nazismo ou ao regime de Mussolini não tem, evidentemente, a conotação do paganismo clássico, mas a da militância católica (nisso, Rolão Preto era mais um concorrente do que um adepto do 'paganismo').

O 'parti-pris' impede de ver em Salazar qualquer evolução, e o regime a que deu o nome (mas que não foi criado por ele) será invariavelmente um fascismo puro e duro. Para quem assim vê a história, quanto menos se revelar do homem e até da sua psicologia dita ruralista e clerical, melhor será.

Mas é precisamente essa atitude que nos está a impedir de fechar mais um capítulo da nossa história, e de fazer o necessário julgamento do passado.

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