Cristina Campo (1923/1977) |
"A paisagem, a linguagem, o mito e o rito, que são
os quatro elementos da felicidade, tornaram-se hoje o alvo do ódio concentrado
do ocidente."
(Cristina Campo)
Os dois primeiros alvos parecem-me óbvios. A paisagem,
porque nos tornamos cada vez mais artificiais e só sabemos relacionar-nos com a
natureza, no melhor, como meio ambiente, ao mesmo tempo que a agredimos de modo
compulsivo. A linguagem sofre hoje uma das suas maiores mutações em
consequência da tecnologia das comunicações. É provável que alguns
contemporâneos de Gutenberg vissem por detrás da sua invenção e dos efeitos
desta um ódio ao passado. Mas sabemos que não foi isso o que aconteceu.
Já quanto aos mitos em que acteditávamos, o que houve foi uma substituição por novos
mitos em que "fazemos de conta" que acreditamos. O melhor exemplo é o
da publicidade. Não engana ninguém, mas a tentativa lisonjeia-nos, de alguma
maneira, por causa do interesse demonstrado (pelo nosso poder de compra).
Trata-se, contudo, duma "ironia" diferente
daquela com que já o Grego mais "blasé" encarava a mitologia. Não
seremos ingénuos ao ponto de pensar que Platão acreditava nos Olímpicos como
uma boa alma. Ele que falava em mentiras úteis para lidar com o "Grande
Animal" (só esta metáfora sobre o
povo constitui o maior "impensado" da democracia, o qual transitou sem problemas até ao século XX
e a Karl Popper).
Mas, finalmente, serão os ritos "perseguidos" na nossa
sociedade? O que quer dizer um ódio ao rito?
Sabemos que o ritual é a falsa superfície da religião.
Que a entrega ao espírito da coisa é já metamorfose. O fora, como dizia Comte,
é que molda o dentro.
Estaremos também mais "distantes" na observação
dos rituais, sejam eles familiares, profissionais, políticos ou religiosos? Ou
são as nossas práticas quotidianas, o nosso modo de vida, que neutralizam o
ritual, tornando-o uma simples ocupação do tempo?
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