quinta-feira, 24 de março de 2016

A MORTE DE CADA DIA




"A ciência, no sentido moderno da palavra, consiste em fazer depender o saber do poder; e vai até subordinar o inteligível ao verificável."
(Paul Valéry)

Isto só não é óbvio porque, modernamente, a ciência substituiu a Providência. A ciência que nos livrará da morte, amen. Entretanto, numa altura em que começamos a vislumbrar a cura para várias doenças, a morte tornou-se o verdadeiro 'espectro que assola a Europa'.

E de que armas dispõe essa ínfima minoria de radicalizados por um ectoplasma religioso da Idade Média? Da crença fanatizada e da falta de alternativas. Como sabem todos os clandestinos e revolucionários, e sabiam os anarquistas russos e os bombistas de Chesterton, todos a certa altura entram num caminho sem regresso e acabam por aquirir o gosto da morte para prosseguirem.

Ora, é só a nossa impreparação para a evidência e para a omnipresença da morte que espalha o medo instantâneo e global. A conjunção do terror e dos 'media' veio para ficar e alimenta esse medo. Percebemos, o que os outros que vieram atrás já tinham percebido. Um símbolo, nem que encarnado num único indivíduo, pode vencer um exército. Constantino parece que acreditava nisso...

E a verdade é que a ciência não nos preparou para estas consequências do seu espectacular sucesso  que nos alienou da nossa morte de cada dia.

'Conhecemos' e adoramos a 'húbris' do poder, da força, do prestígio, do dinheiro. E, no fim de contas, são essas as 'condições de produção' da ciência como instituição. O resto é a esquizofrenia de que falavam Deleuze e Guattari.


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