sábado, 23 de março de 2013

DO SUBLIME AO RIDÍCULO

 

"O suplício da crucificação chega a ser ridículo. De acordo com a representação da cena que vemos em quadros antigos, as pessoas junto da cruz entretinham-se a jogar e com outras distracções, mas não quero ocupar-me deste assunto por mais tempo. Perante uma santidade tão grande, tão assustadora, parece-me mais indicado o respeito."


Robert Walser ("Uma estalada e outras coisas")

Compare-se isto com estas palavras de Simone Weil:


"Os mártires atirados às feras que entravam na arena cantando não eram infelizes. Cristo era infeliz. Ele não morreu como um mártir. Ele morreu como um criminoso de direito comum, misturado com os ladrões, apenas um pouco mais ridículo. Porque a infelicidade é ridícula."

("A Espera de Deus")

Nada parece mais longe do sagrado do que o riso. Mas, segundo Simone, era necessária essa distância para se atingir a humilhação e a infelicidade supremas.

E se nos aproximarmos duma representação da cruz, sem amor e despidos dum olhar esteta, e nos conseguirmos abstrair do sofrimento em efígie, ocorrer-nos-á, talvez, pensar que para os Romanos e para os que o crucificam hoje, ele não é mais razoável do que o herói de Cervantes e, como ele, atinge o ridículo, embora dum modo sublime.

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