segunda-feira, 4 de março de 2013

CAVERNÍCOLAS

Abraham Lincoln


"Mas será sempre verdade que 'ninguém engana toda a gente todo o tempo?' Ou a televisão terá o poder - ou já o tem - de reduzir o credo lincolniano a mais uma frase feita, ou como hoje se diz, a um conteúdo? Um 'conteúdo' sem frase nem fraseador. Um vazio."

(João Bénard da Costa)



Lincoln, ao dizer que 'ninguém pode enganar toda a gente todo o tempo', acreditava na verdade estatística, no efeito 'ordálico' das opiniões diferentes e até contrárias, no cômputo final. O resultado será a espécie de 'carácter' da soberania popular, idealizada por Rousseau. Como um corpo agitado que, por fim, encontra a sua 'assiette', o seu ponto de equilíbrio.

Infelizmente, mesmo antes do advento da televisão e dos outros mídia, talvez ainda mais poderosos, o povo arregimentado pelo nazismo forneceu a prova contrária: pode encontrar-se o 'ponto de equilíbrio' no extremo dos extremos, embora isso seja um 'Cisne Negro', como diria Nassim Taleb.

É o suficiente, porém, para acabar com as nossas certezas.

Mas depois que sobre esse astro frio, com o seu ponto de mira, se assestaram os olhos e os ouvidos de milhões, deixou de fazer sentido a frase enigmática de Cristo, em Mateus: "Quem tem ouvidos para ouvir que oiça."

Para ver e ouvir era preciso um aviso, porque a atenção 'abria portas' que, sem isso, permaneceriam fechadas, e estava em causa a 'salvação'. A televisão, essa, atrai o nosso olhar e o nosso ouvido como o fogo da caverna platónica.

Platão não hesitaria em considerar que os seus 'cavernícolas' estavam enganados, todos, o tempo todo. Estão, porque ninguém os engana. Eles é que se alimentam do engano.

Por essas e por outras, é que não acredito no monstro berlusconiano.

0 comentários: