"Mas com o tempo, o seu deus adquiriu uma verdadeira mania legislativa e na actualidade o corpo jurídico constitui um imbróglio tão inextricável e minucioso que é impossível não incorrer em falta continuamente."
(Eduardo Mendoza, "A assombrosa viagem de Pomponio Flato")
É outra versão do pesadelo de Kafka. Não se trata de leis absurdas que colocam potencialmente a vida de toda a gente (K é qualquer um de nós) à disposição dum intérprete aleatório da transcendência juridicista.
A 'mania legislativa' talvez seja só a vontade de regular a realidade, de criar no plano das leis o contraponto do indivíduo culpado por definição. É a vida do 'direito' que é a 'verdadeira vida', como dizia S. Paulo da 'vida em Cristo'.
Pelas melhores razōes, pela racionalidade mais alicerçada, O 'corpo jurídico' complica-se para lá de qualquer funcionalidade doutrinária (que no melhor dos casos, seria a da justiça). É um acervo descomunal onde se 'pesca à linha' segundo o interesse que aparece.
No limite, podemos todos, de facto, estar em falta. Por causa desse estado suspenso da nebulosa jurídica, em qualquer um pode cair o aguaceiro da fatalidade.
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